Renascemos do pó, que restituiremos um dia à
terra, quando nosso espírito retornar à casa.
"Somos poeira das estrelas", dos sóis
e cometas, que não existem mais. Uma
explicação romântica do nosso surgimento.
Ao menos sabemos da gênese de uma parte da nossa aparição!
Somos corpo e espírito, mais espírito que
corpo. Mais que a metade e ninguém fala sobre isso... Qual deles é capaz de manter sua identidade
depois da separação? A carne perece e o
espírito permanece. A carne provém da carne, mas de onde vem o
espírito? Ele sopra aonde quer...
Aninhados nas entranhas de uma espécie de "terra", recebemos todos os
elementos de que necessitamos para forjar nosso molde, que deverá conter, dentro e ao redor, a vida que nos anima. A "existência"
é muito mais antiga, bem anterior à nossa
posse da consciência. É serva fiel a
serviço da vida. "Somos feitos de
silêncio e sons". Sentimos, bem antes de
aprender a pensar, mas ainda somos um emaranhado de frases desconexas, de
reações químicas, processos estranhos, que não fazem o menor sentido, que só
passará a significar algo quando viermos
à luz. E toda uma vida pode não ser
suficiente para avaliarmos o seu
propósito!
Nesse laboratório "in carne",
as matérias primas são manipuladas.
Experimentos de Deus, que a cada vez se aperfeiçoam mais. A mãe natureza nos provê de tudo quanto precisamos para nos tornarmos "viventes" nesse mundo. Ossos, músculos, nervos, órgãos se formam através
de fórmulas secretas, guardadas num cofre que não podemos abrir, e mesmo que
pudéssemos, o que faríamos com elas?
A medida que nos desenvolvemos, esse
laboratório fica pequeno e desnecessário.
Não é por vontade própria que saímos dele e nos damos à luz... É por puro desconforto, somos praticamente
expulsos!
A primeira vez que nossos pulmões fazem o que
lhes é próprio fazerem, sentimos o ar rasgando os tecidos. Dizem que isso dói, e então choramos. Outros choram conosco, mesmo que por outros
motivos!
Apresentam-se a nós o frio, a claridade, a
fome... Forçados a usar nossos sentidos
e órgãos, vivemos a partir de agora por nossa conta e risco. Ainda
assim, tudo nos é suprido pela mãe natureza:
aconchego, penumbra, alimento. Conhecemos as cólicas, a sensação de
desamparo, fora do laboratório de paredes grudadas a nós, temos medo de cair. Acolhidos com o que há de melhor, embora nos sintamos
perdidos nesse grande vazio que nos recebe, alguém nos envolve e simula as
paredes que nos circundavam. Ouvimos então
os sons sem filtro algum.
Nossas células recebem todos os recursos para
se desenvolverem. Aprendemos a usar nossas
mãos, a caminhar, a interagir, a usar nosso coração para fins diversos daquele
de bombear a vida.
Crescemos, e em algum momento de nosso
amadurecimento físico, descobrimos em nós a capacidade de gerar outra
vida. Só então, é que avaliamos o que é
estar do outro lado do vidro!
Passamos da maturidade à lenta decrepitude física,
contando sempre com a generosidade incondicional da natureza. O intercâmbio, sempre muito desigual, nós mais recebedores do que doadores.
Quando convidados a restituir à terra tudo
quanto recebemos, não porque queremos, mas porque nosso espírito quer voar;
somos forçados a devolver o que recebemos.
Justamente, quando já não nos serve mais. Devolvemos, em uma doação "post mortem", o que nos restou,
do uso que demos, do que recebemos. Depois de toda "pilhagem" em vida,
nosso corpo vai descansar. Perdeu a
utilidade.
A natureza, que é mãe, quando um de seus filhos morre, faz nascer uma flor, sobre o corpo inerte de volta às suas entranhas, em sinal de seu desprendimento. Uma homenagem ao seu filho que jaz!
22/08/15
Nenhum comentário:
Postar um comentário