segunda-feira, 29 de agosto de 2022

1529




O NOME ACIMA DO NOME


Aprendi que o outro é o que é, e não importa qual contorno eu desenhe sobre ele; será sempre, quem ele é!  

Sei que uma hora e outra, necessito de indulgência, e que me será dada na mesma medida, em que eu a houver concedido.  

Estarei a percorrer os velhos ciclos, se não os encerrar.

Constatei que minha visão é curta, que eu vislumbro o futuro, enquanto tenho a eternidade à minha frente.

Quem me criou não dorme, cuida de mim, da minha vida e de todos os meus feitos.  O Nome que está acima de todos os nomes! 

Comigo há uma luz, ela se estende da minha casa, vai à minha frente, iluminando meu caminho; me acompanha dos lados e abaixo, sustentando-me; vai atrás, me impulsionando a ir adiante e acima!  




sexta-feira, 19 de agosto de 2022

 1528



PÁGINAS FALADAS

Nem todas as histórias são contadas nos livros.  Algumas escapam, são passadas de geração em geração, num relato oral e se tornam verdadeiros mitos, tal a dificuldade de comprovação de suas reais existências.  À medida que o boca a boca as repassa, se fortalecem como história paralela, que acompanha e complementa a história oficial.  Como toda lenda, guarda sempre um fundo de verdade, é preciso incluí-la aos relatos conhecidos.  Existem fatos e pessoas, grandes ou pequenos, esquecidos ou desprezados, às vezes capítulos inteiros, mas que determinaram o rumo dos acontecimentos, como estes se deram.  Influências decisivas na história da humanidade, que conservam sua grandeza e importância, apesar de não serem mencionados ou considerados pelos historiadores. Se não os incluirmos, a história verdadeira se perderá em buracos e inconsistências, comprometendo o sentido dela mesma, como um todo; falseando a origem e a finalidade da vida.

Nem todos os sentimentos são declarados, nem todas as emoções reconhecidas e nem todas as sensações levadas em conta - muitos são engolidos ou ignorados, sem com isso, deixarem de guiar os nossos passos.  Os engolidos voltam às bocas e os ignorados se fazem conhecer, de maneira indireta, de uma forma ou outra - sobem à pele e dirigem-nos nas atitudes.  Não se despreza a história contada, nem se enterra o que se sente.

domingo, 14 de agosto de 2022

 1527





O SANGUE DA TERRA

Uma forte onda avança sobre a praia das minhas emoções.   Na sua ferocidade, invade-me com a esperança de renovação e remexe as certezas fincadas, na faixa de areia.  Ao recuar, leva consigo algumas, e deixa para trás, outras tombadas, com as raízes de fora; talvez para que sejam replantadas em solo mais firme.

Como pulsa o meu coração, assim bate o coração da Terra.  Guardado no centro e impulsionador das marés, suas águas salgadas avançam e recuam.  Pulsações obedientes, cada uma à sua cadência, a minha com maior frequência que a dele.  

O sangue arterial irriga todas as células, com hormônios de vida, alegria e de uma certa forma estranha e mágica, deixa nelas alguma esperança, não a retira de todo, apesar da maré venosa, vir e levar os resíduos ruins para longe, deixa o que é bom.

terça-feira, 9 de agosto de 2022

 1526




PONTAS E ARESTAS

Apesar de parecer, que ‘pontas’ seja sinônimo de ‘arestas’, aqui nesse caso, não é. 

Costumamos nos imaginar, como sendo o que preenche o recipiente, com o formato do nosso corpo, cujo limite e divisa coincidem, com tudo que cabe dentro da nossa pele, um molde vivo – a imagem exata que o outro vê.  Não é nem um pouco assim, muitos de nós, nem nos contentamos com o corpo que temos, não nos identificamos com seu formato, volume, cor de pele, gênero e por aí afora; embora possamos demonstrar outra coisa.  Essas, são exigências nossas, quanto ao aspecto físico - reclamações ‘à fábrica’, pela fôrma usada, que nos fez dessa ou daquela forma.

Por mais que as pontas sejam amarradas, as quais nos parecem soltas e inconvenientes, na nossa vida sempre restará uma discrepância: entre a quantidade que amarramos e a quantidade a ser amarrada.  Má notícia: sempre haverá pontas soltas!  Esses inconvenientes, que por fugirem do nosso entendimento, não se encaixam na nossa lógica.  Sofrivelmente, vão aos poucos, sendo ligados uns aos outros, formando peças novas, e depois de colocadas no seu devido lugar, formam um mosaico interessante e passam a fazer todo o sentido.

As arestas são aquelas saliências, para além do nosso corpo, que escapam através das nossas emoções, quando sem arreios, e que traem nosso pretenso controle, quando temos reações desproporcionais em relação às situações vividas.  Às vezes, respondemos a certo estímulo, de forma exagerada, para só depois percebermos, que não era para tanto.  São discordâncias entre o que vemos no espelho e o que existe; entre o que somos e o que pensamos ser – não são propriamente ‘defeitos’, e sim acertos, ainda a serem feitos na nossa personalidade.  A função do espelho é refletir imagens; se tivermos coragem de visualizar tais arestas, será preciso recorrer ao outro, como sendo o nosso verdadeiro espelho – um refletor com mais amplitude, de sinceridade e transparência.

As pontas, nós sabemos que nos incomodam; as arestas, nem sempre temos consciência que as carregamos.  O que elas têm em comum? ... Ambas demonstram que há um trabalho de desbravamento a ser feito, em direção ao nosso interior: sobre o que trazemos de recheio, para chegarmos ao miolo e descobrirmos do que somos feitos ou seja, conhecermos a nossa essência.  Ambas são de nossa propriedade e de ninguém mais.  Não cabe a mais ninguém, cortá-las, isso é de nossa inteira responsabilidade.



domingo, 7 de agosto de 2022

 

1525



O GÊNIO FORA DA LÂMPADA

Se ele saiu, já não pode mais ser recolocado.  Condensa-lo novamente, para caber no mesmo espaço? ... impossível! 

O mesmo acontece, com as palavras ditas - uma vez expandidas e verbalizadas - não teremos mais acesso, a cada uma das letras aleatórias; porque agora juntas, compõem e significam algo com identidade e intenção.  Impossível desdizer. 

Querermos recolher as letras e faze-las voltarem ao seu estado inicial, é tão absurdo, quanto sairmos por aí, à caça das moléculas estranhas e voláteis, desobedientes às leis da química, da física e da concepção que temos de toda a matéria, de um ser fictício. Seria negar às letras, a liberdade conquistada; seria matar a nossa capacidade de criação de coisas possíveis, a partir de coisas, antes inimagináveis, mas que só precisam se adaptar às condições de vida, que o exterior impõe.  Uma vez, o gênio do lado de fora, é impossível a ele, retornar e retomar ‘o paraíso’ que perdeu.  Para nós, certas atitudes e comportamentos, nos roubam toda a possibilidade de tranquilidade de consciência; podendo direcionar nossa vida, para um destino nunca desejado.

Conservar o gênio guardado, muitas vezes é vital, tanto para os relacionamentos, como para o próprio gênio – que permanecerá no habitat, ao qual pertence, confortável e coerente com a natureza, que lhe é própria.



quinta-feira, 4 de agosto de 2022

 1524




ASSIM NÃO FOSSE ...

Passei a limpo, tudo o que estava na mente, transcrevi sentimentos e percepções, captados por todos os meus sentidos, que pululavam, de cá para lá, em 'ideias irrequietas'.  Mal se continham no espaço finito, onde haviam nascido.  

Foi dar à luz, a pensamentos mais organizados, não necessariamente, mais harmônicos ou com maior nexo, apenas menos desordenados e um pouco mais inteligíveis.  À medida que as ideias foram descendo, criaram corpo, coerência, ganharam identidade - assim não fosse, nunca amadureceriam.



quarta-feira, 3 de agosto de 2022

 1523




Todos as terminações nervosas parecem ter migrado para lá; todo o sangue do corpo afluiu para a mesma região; sinto o latejo de um coração, que mudou de lugar.  Febre e desconforto, instalados e sobrepostos, no local que dói.

É assim, com relação à dor, e de forma idêntica - uma preocupação latejante, que me lembra insistente de sua urgência, também não cede.   Embora eu tivesse resolvido me dar uma trégua e ter buscado um pouco paz - por não ter chegado à conclusão alguma - ela não sossega, enquanto não me recorda da sua existência.

Diga, se não acontece o mesmo com a dor?  Apesar da decisão de suportá-la, ela fica batendo na tecla ‘dó’, o tempo todo, fazendo um barulho nevrálgico de fundo – uma musiquinha enjoada dentro da cabeça, não me deixando esquecê-la, nem se esquecendo de mim.


arte | marcin piwowarski