segunda-feira, 20 de dezembro de 2021


1434

AS INQUIETUDES E O MICROVERSO




Elas nascem inofensivas, trazem 'um não sei que' de desconforto, um mal estar.  Saem das páginas do tempo de lá de trás, saltam para frente, meio zonzas em direção ao tempo presente e quando se instalam, nos causam uma aflição desproporcional ao seu tamanho e à consciência que trazem consigo - nossas pós_ocupações.

São pequenos anzóis quase invisíveis, que nos fisgam os olhos, as entranhas ou qualquer parte nevrálgica do nosso corpo, provocando uma dorzinha de dente insistente e difusa, uma falta de ar imaginária, um incômodo perceptível.  São as pedras lançadas ao centro de um lago, aparentemente tranquilo, denunciando que nem tudo está tão calmo.  À razão, tudo está bem; porém para o emocional, é como se arrastássemos uma ponta preocupante com algo pesado, que nem sabemos o que é, exatamente - com coisas incógnitas e perturbadoras. Nesses casos a identificação a ser feita, é motivo de corajosa busca.  

Às vezes, elas vêm com nome, endereço, idade e um respectivo 'qr code' com todas as demais informações necessárias, para serem reconhecidas, porque conhecidas, elas já são.

Têm aquelas que dão um salto inverso, em direção oposta aquelas que vêm do passado.  Vêm do futuro, vêm de um tempo ainda não decorrido, de uma divagação mental nossa ou de um desejo fervoroso, que só em nossas ideias, acalentamos e guardamos - nossas pré_ocupações.  Como se não fossem, as ocupações diárias, suficientes para o próprio dia!

Decididamente, vivemos em muitos tempos, ou melhor, eu vivo (!) ... e eles estão a se sobreporem o tempo todo - o passado visitando o presente, que por sua vez, bisbilhota o futuro e confere o próprio passado; o futuro que quer interferir no presente ou no passado ... sei lá ... é muita coisa acontecendo ou não acontecendo, de fato.  E eu, que sou só um, me divido entre os muitos tempos, os muitos sentimentos, os muitos pensamentos e as muitas pequenas realidades ... todas minhas!  Não me é possível estar em todas ao mesmo tempo, com a mesma integridade.  Vou deixando pedaços meus, aqui e ali, e quando os reencontro, vou recolhendo um a um. 


sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

1433

VOZ


A voz pode calar.  Pode perceber, que perdeu a eloquência ou cansar-se, ainda pode optar pelo mutismo seletivo.  Uma voz, nascida forte, pode aos poucos, sentir-se cerceada e tornar-se com o tempo, praticamente desnecessária, ao final de tentativas infrutíferas na comunicação.  O sentimento e o pensamento não se calam nunca, um sobe e o outro desce, caminham até a boca, e lá ficam presos, entre os dentes e os lábios cerrados.  O que deveria ser a foz, torna-se cela e apatia.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

1432

SEMENTE




A frieza, de cima da mesa não era tua.  Era sumo da verdade crua, do sopro que já não existia, largado sobre a pedra fria.  O calor que em meu peito ardia, era fruto do exemplo inteiro e é flor, que revive no meu canteiro.  Como um espinho invisível, pode causar essa dor incostestável!?  Essa vida, que em mim, ainda vive, é certeza adquirida, de que sou literalmente,  apenas, uma semente tua!



terça-feira, 7 de dezembro de 2021

1431

SOLO LO QUE QUEDA




No se sabe en qué orden sucedieron esas cosas: arrancar las fotos, comerse la esperanza, espantar la alegría y quemar las flores de papel.  Después de todo eso, él quería continuar la historia, de la misma manera que antes. Después de apagar la luz y oscurecer la casa, él esperó la cama tibia, el café recién hecho, la atención, como si nada.

Allí se fue la claridade y la esperanza se desvaneció.  La cama se ha enfriado, el café se ha agriado.

Ya no hay razones para cantar y bailar ... ni amar ...  Solo queda: llorar y no esperar nada.


sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

 1430

NEM SABES




Que trago meus nervos sentidos; e que te vejo de longe, com meus olhos compridos.

Nem sonhas, que já nem és mais, um ser de verdade; és uma subjetividade minha!

Quisera que fosses meu pássarro não cativo, e que tivesses um motivo, de viver no meu jardim.


arte christian schloe

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

1429

ALGUMAS E CERTAS




Algumas ideias e certas necessidades, nos levam a dar uma volta ao mundo, através dos nossos pensamentos, gastamos fosfato para arranjar um jeito de realizá-las ou suprí-las; mas é a dor que nos traz de volta ao presente, ao ponto essencial, ao que realmente é, e o que importa.  Somos obrigados a repensar sobre as prioridades e sobre a classificação de urgência que damos a elas.  É nessa hora que nos lembramos da célebre frase - "éramos felizes e não sabíamos".  Quando a adversidade vem e passa uma rasteira nos nossos planos para o futuro, eles estouram como bolhas de sabão em pleno ar.  Nossa mente nos dá as asas, com que tanto sonhamos e o nosso corpo as arranca.

Essa retomada de consciência forçada, faz parecer que tanto as 'algumas ideias' quanto as 'certas necessidades', são muitas, são incertas e dispensáveis.  O nosso apego e a vontade anteriores, tornam-se ridículos, em face da nova situação, que nos põe cara a cara com a real importância do momento. Lá se vão as asas e nos resta na boca, o gosto metálico do medicamento ministrado. Vemos a nossa humanidade sendo exposta, na mesa de cirurgia da realidade, deixando bem claro que somos feitos de carne e ossos bem doloridos, muito antes de sermos seres pensantes, sobre nossas conjecturas a respeito de filosofia ou qualquer outro assunto.  Enquanto nos vemos presos à terra e às necessidades básicas de bem estar,  tudo o mais, que nos era tão importante, esvazia-se.