sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

1629



 A GRANDE VIDRAÇA

Estou de frente à uma vidraça enorme.  Minha curiosidade me faz querer saber, o que ela guarda do outro lado, mas o vidro só reflete o que há desse, mantendo o seu interior em segredo.  Só posso ver o que me rodeia.

Incontida no meu insatisfeito desejo de conhecer o que ela me oculta, encosto meu nariz na superfície lisa e fria, coloco minhas mãos em concha sobre meus olhos ... e como num passe de mágica, ou como, se ela aguardasse um movimento decisivo meu para desvendar-se ... consigo ver o que há por detrás da superfície, revelada espelhante, até então.  Vejo inúmeros degraus, pequenos, perfeitos, que podem me levar acima, em curvas, que se esgueiram à visão e se escondem, umas nas outras, provocando mais curiosidade. 

Subo um a um, com determinação e coragem, porque é preciso um certo esforço, para permanecer na escalada.  Sigo sem muito tempo de apreciar o que está ao lado, pois não posso me deter em cada degrau, tempo além do que necessito para pisá-lo.

Em certos intervalos existem platôs, onde é possível amenizar o ritmo da subida, e é justo nesses instantes, que aproveito para olhar para trás e visualizar todo o cenário, inclusive o trecho de antes da grande vidraça – para minha surpresa, ela não existe mais!

O trajeto à frente, ainda é de certa forma oculto, com trechos sinuosos e desconhecidos; bem diferente do caminho já percorrido, que se torna totalmente visível.

A vidraça é a divisa que nos mantém no presente, e é preciso uma maior acuidade visual para enxergarmos através dela.  Uma vez atravessada, descortinada por nós, ela se desfaz e seguimos ao encontro do futuro.  Nos instantes de pausa, é possível, constatarmos o passado trilhado por nós, como quem aprecia o feito de uma escalada perigosa, mas ao mesmo tempo, sente o prazer de uma conquista: superando o medo, a inércia e o incerto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário