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PERIGO DE ÁGUAS ESCURAS
O estrago que as mãos não têm coragem de fazer, a boca faz, sem dó nem piedade, com as palavras que profere. Elas perfuram, cortam, dilaceram e esgarçam os tecidos pra sempre, como lâminas afiadas que são.
São punhais, facas, espadas, todo tipo de arma branca, silenciosas e certeiras no ataque. Estão sempre de prontidão, em riste, e não deixam ninguém a salvo. Sempre preparadas a fazer cortes verticais no bucho e espalhar as vísceras de suas vítimas, sem que haja a possibilidade de suturar os ferimentos.
Essas bocas são fossos, onde vivem crocodilos, muitos, famintos e desesperados por carne, com mandíbulas nervosas e perfeitas pra dilaceração dela. Os desavisados e bem intencionados, não saem ilesos. Sobrevivem, mas não sem uma mutilação de membros, ou a falta de alguma parte importante. Estar pelas redondezas desses fossos é desafiar a morte a todo instante.
As águas aparentemente calmas, escondem um perigo, porque a fome de que são apossados, não se extingue, por mais que se alimentem.
A superfície calma de suas águas, já não me engana, sofri golpes suficientes pra saber disso – de que não posso confiar nessa calma traiçoeira e calculada. Devo ficar alerta, num instante um deles pode emergir do silêncio escuro e atacar, a mim ou a quem estiver às margens ou nas proximidades. Não é um local seguro, o perigo espreita sempre, nem a relva cresce por lá, por onde arrastam suas carapaças, em incursões de busca de novas vítimas.
Atacam uma, atacam outra, sem dar chance de fuga ou defesa, usam dentes, garras, o corpo pesado e flexível, e a cauda como chicote.
Sem a mínima cerimônia ou remorso, perpetram a destruição da vida, de uma forma fria e calculista, executam a carnificina, como bons predadores que são.
E calmamente, se deitam ao sol – tranquilos, pra esquentarem o seu sangue frio – ainda trazendo em seus dentes os restos mortais alheios. Enquanto esquentam o seu, o sangue das vítimas esfria.
10/04/17
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