309 | IMPLÍCITO | 23/11/16
Seria de nostalgia romântica, se não fosse – sabidamente - algo tétrico e mortal de se ver.
A cena se passa no tempo em que eram desconhecidos os efeitos nocivos do fumo, embora já se soubesse que o abuso do álcool poderia acabar com a vida de quem o ingere, e de outros tantos a volta.
Um cigarro dançava na boca entreaberta, anéis de fumaça subiam ao teto, pequenos, grandes, em sequência ou solitários. Olhos fixos e baixos, ali prostrado, nas mãos, um copo de uma bebida forte o suficiente para anestesiar. Dentro dele, cubos de gelo também dançavam - ilhas suspensas num oceano envelhecido - onde podia-se imaginar em cima de alguma delas, algum animalzinho em extinção, pedindo socorro. Ao menos, era isso que os seus olhos vidrados viam, sem apresentar características humanas, porque pareciam um espelho, feito do material inorgânico de que lhe é próprio.
Ele conseguia ver-se, naquele cubo de gelo, acuado e apavorado, a mendicar ajuda. Imaginava-se, lá em meio ao líquido, fazendo anéis de fumaça com seu cigarro, porque não tinha como fazer fogo em cima do gelo.
Na sua imaginação, ele desenhava com a boca - as letras S.O.S.
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