quarta-feira, 6 de novembro de 2019
1089 | UM GARIMPO SOLITÁRIO | 06/11/19
Não quero experimentar analgesia. Seria sofrer de dislexia emocional, onde o sensorial, sem saber identificar o que ele sente, perderia sua função.
Como, sem ligar o fonema ao símbolo correspondente, eu ficaria, da mesma forma: sem saber se algo é bom ou ruim, sem poder ligar um estímulo à sensação alguma.
Prefiro tê-las dolorosas, as sensações chegando à pele, pelos caminhos nervosos; a ter a insensibilidade ao toque suave e às doces impressões. É impossível livrar-se da dor, sem se livrar do seu oposto - esquecer do que é a dor, não me permitiria conservar a lembrança, do que é a alegria.
Deus me livre de não sentir nada, deixaria de ser humano: de saber que, o que dói ou coça em mim, dói e coça no outro também.
Não consigo imaginar a vida sem a dor e o prazer; a literatura não existiria; os limites não existiriam, pois não é a dor, um limite ao nosso sofrimento? É nesse limiar, que começamos a examinar a nossa ferida: o que precisa ser feito para curá-la, qual unguento devemos usar, ou o que precisamos fazer, para cessar a dor, que nos aflige, até mesmo, extirpar a parte infeccionada.
Foi escrito muita coisa bonita, das coisas boas da vida, isso é fato. Mas muita coisa linda, foi ordenhada, das piores dores, que o ser humano pôde suportar.
O garimpeiro não encontra facilmente, as suas pepitas de ouro. Ao contrário, é preciso que ele treine seus movimentos com a bateia, aguce seu olhar, para poder encontrá-las, em meio ao cascalho, que lhe fere as mãos enrugadas.
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