sexta-feira, 29 de novembro de 2019



580 | OUTROS OLHARES | 01/12/17

Acordamos, o bairro todo e eu, com o barulho de um helicóptero rondando os ares.

Nessa hora percebi que tinha dormido na gaveta, num envelope ou numa cama de pregos.

As minhas preocupações todas, pegaram uma carona nesse helicóptero.

As mesmas que durante a noite ficaram adormecidas, àquela hora do dia estavam refeitas e bem barulhentas, a me incomodar o sossego.

Elas definitivamente, não deixam que eu me esqueça delas, seja em forma de helicóptero barulhento, buzina, carro de som, elas me arrancam da zona de paz,
 em que me coloco forçosamente, me avisando que estão presentes e fortes.

Meu objetivo é passar mais tempo possível nessas zonas de paz criadas por mim, a duras penas - onde eu durmo ou fico acordada, que sejam cada vez mais prolongados os períodos de minha permanência lá.

Não pense que nessas zonas não existam barulhos ... existem sim ... mesmos barulhos, mesmos ouvidos ... com outros olhares.







312 |  EM TEMPO | 30/11/16


Em meu desejo inconfessofiz  uma promessa,
só a mim mesmo ... revelada - de sequer levar à luz !

Inaudível, eu diriavibra-me o coração,
de querer-te  junto a mim, em  saber-te
de mim tão separada, por um oceano de distância !

As palavras? Essas ... de nada me adiantam !
Meu sentimento, imperceptível !

Aprendi então, a fazer precesa pedir que o oceano seque
ou que um de nós dois ... se teletransporte !

Pouco me importa o meioa mágica, o veículo, instrumento,
desde que isso se dê um dia ... e que eu não esteja muito velho !

arte | agnes cecile


1096 | VIVO EM MIM | 29/11/19

A língua repousa no chão da boca.
As ideias descansam no aposento de cima.
O alimento chega certo, onde é preciso.
A essência transparece, a alma é leve, 
o corpo não pesa, a vida é viva.
O coração bate, bem espaçado. 
O peito arfa, profundo e calmo.
Mãos certeiras, estão a criar.
Pés tocam o caminho, inteiros. 







835 | TODOS OS MOTIVOS | 29/11/18

Há muitas formas de matar, muitas maneiras de desamar.  Há atitudes que separam e afastam.  Há palavras torpes que cortam e marcam.  Mas sempre, sempre deve haver motivos para celebrar a vida, mesmo que inventados ou reinventados por nós.

Seguirei acreditando na existência de um amor gostoso, na possibilidade de um toque suave, de quem não toca somente a pele.

Embora a estrada à frente seja escura, confiarei que alguns passos em direção diversa, podem me levar à uma outra rota, mais colorida.

Quando se quer viver, quando se quer amar, quando se deseja trilhar, lado a lado, o mesmo caminho com alguém, sem danos e sem nada tirar, apenas somando e multiplicando, permitindo que outro seja ele mesmo, é possível ...

Buscar um outro caminho, encontrar outros campos, que me permitam encher os cestos de frutas e flores, para depois descansar à sombra de um amor tranquilo.  

Então, terei construído uma outra vida, nova, com toda a alegria de ser vivida, com todos os motivos para ser celebrada.

Do contrário terei vivido uma existência não desenhada para mim, privada de vida, alegria e celebração. 





836 | UM BOM USO | 01/12/18

Se o teu olho for impuro
ele pode não ser extirpado
mas a algum tipo de escuro
sem dúvida, tu serás jogado!

Se torpe, é a tua boca 
será igual à uma toca
medo e perigo espreitam.
Se tuas mãos machucam
podes perder os movimentos
e sofrerás os desdobramentos.

Se teus pés forem incautos
deves pagar certos tributos
de ficares preso onde estás
com dores imprevistas
a depender de outros tantos
ou dos fortes ventos ...

Tua palavra nos fala
do que os teus olhos leem
do amor que descreem
do que carregas na mala
e do que é cheio teu coração
...  verbos plenos de laceração!

O que tu recebes
equivalerá ao que cedes.
Se não dás do que é teu
do que Deus te ofereceu
se não o aplicas ao bem
tuas forças sucumbem
e as dádivas se perdem!




579 | POIÉSIS | 29/11/17


Nem sei quanta mentira contei pra mim
pra ter um abraço querido, enfim.
Passeei por um lindo jardim
buscando a bela flor de jasmim
sob os acordes de um bandolim!

Ouvi palavras macias como cetim
que se revelaram duras como marfim
numa profecia em grego ou latim!

Gastei todo o dinheiro em festim
e agora me encontro assim! 
Como sair deste confim?

E por quê mesmo ... que eu vim?



poiésis: Palavra de origem grega que, inicialmente, era usada como sinônimo de processo criativo, e depois passou a designar o processo criativo de uma poesia, desde sua ideia inicial até sua elaboração.

arte | agnes cecile
                          

quinta-feira, 28 de novembro de 2019



834 | EM QUALQUER LUGAR | 28/11/18


Poderás me encontrar 
em qualquer lugar
num beco escuro 
detrás de um muro
na pequena praça 
atrás da vidraça
ou nas ruas
por todas as luas.

É preciso que vejas 
o que tanto ensejas
pois os olhos 
não têm ferrolhos.
Os meus te dirão 
límpidos, igual ribeirão:
que trago no peito 
um parapeito
de dores 
e flores de muitos odores.

Qualquer lugar é segurote asseguro!

Na paz das igrejas, nos ladrilhos
frios, me deito e conto as cores, vejo os brilhos.
A graça de um desenho secreto 
eu descubro, bem no meio do teto.

arte | catrin welz-stein



578 | DE POEIRA E SENTIMENTO | 28/11/17

As percepções e sensações são do corpo -  da matéria perdida das estrelas, de que somos formados, inicialmente - apenas nos apercebemos. 

As emoções e sentimentos - são o resultado das percepções e sensações,  captadas pelos nossos sentidos - passamos a pensar sobre o que sentimos.

São a transcrição  e codificação de uma inteligência ou um produto dela - do espírito que habita esse invólucro de matéria orgânica.

De acordo com a sua capacidade de corresponder à realidade à sua volta, essa leitura será mais ou menos próxima da verdade.

Eis do que somos feitos - poeira e sentimento.


quarta-feira, 27 de novembro de 2019


1095 | BOA E HUMANA | 27/11/19

Trouxera a lua e algumas estrelas enroscadas nos cabelos.
Podia-se ver, borboletas esvoaçantes ao redor da cabeça,
a acompanhar-lhes os dias e os pensamentos.
Luz nas mãos, força e vontade de fazer e acertar,
fizeram dela, uma boa e humana mulher.
A sua boca, podia bradar, quando o vulcão irrompia,
mas o hálito benfazejo do seu beijo, era capaz de curar.
Os sapatos apertados nos pés, não lhe impediram andar.
Dera de si, do que tinha nas mãos, na cabeça, sobretudo,
partilhara do que lhe transbordava do peito.


arte | christian schloe



833 | NÃO ERA UMA VEZ  | 27/11/18

Não direi: era uma vez.  Porque ainda é, e continuará sendo, num trabalho ininterrupto de exercitar e incorporar, o aprimoramento contínuo, de um esboço, até que se torne o que deve ser.

A difícil tarefa, de transformar o homem velho em um novo homem, a cada dia, submetendo-o ao tempo de fermentação, colocando-o numa nova fôrma, sujeitando-o ao fogo, para dar-lhe uma nova forma, mais sutil e mais condizente, com a que ele realmente, deve expressar agora.



arte | agnes cecile




311 | FEAR | 27/11/16

Pode ser ...
que enquanto eu dormi, alguém veio
e fechou o lugar por onde entrei
construiu uma parede, onde era porta.
Já não posso mais sair!
Agora não posso, senão ir em frente!
Meus passos são tão pequenos ...
mais parece que não me movo!

Há  ‘desvios obscuros’
outros com uma luz ao fundo e
receosa das sombras que fazem
decido não seguir por eles!
Caminhos que se revelaram todos iguais
quando escolhi entrar por eles!
Não me levaram a lugar nenhum 
acabaram por se tornarem outras
passagens enevoadas e sombrias!

Talvez ...
O corredor em que me encontro
não seja tão longo ... pode ser!
O meu medo, o faz assustador
quando as imagens que estão dentro
se projetam para fora de mim!

Pode ser ... eu não esteja pronta
para falar, nem para ouvir
ou para ver!

Pode ser que eu encontre
a solução para a ‘sua’ busca à  liberdade
... mas não a minha!
Encarcerada ainda estou!

Pode ser ...
que a resposta que procuro
esteja perto de mim e
pela escuridão não consigo vê-la.
Pode ser ...
que estivesse num desses ‘desvios obscuros’
que não tive coragem para escolher seguir!


Fear = medo


terça-feira, 26 de novembro de 2019




39 | SOBREVIVENTE | 24/11/15 

Eu matei você. 
Não era para ser assim. 
Mas era você ou eu. 
Não havia lugar para os dois. 
"Dois corpos não ocupam o mesmo espaço".

Propus que partilhássemos o abrigo e as provisões, 
que déssemos as mãos para enfrentar a escuridão e o frio... 

Riu-se, quando senti medo dos fantasmas que chamou para me assustar 
e ainda apagou uma pequena fogueira acesa por mim.

Sempre tão na defensiva, dividir seria para você, 
uma possibilidade de perder ... e só queria somar e multiplicar!

Foi em "legítima defesa".  Questão de sobrevivência!

Doeu mais em mim do que em você, que despercebido do que houve, 
segue por aí como se estivesse vivo!




577 | MESTRE 26/11/17

A sua barba era tão espessa, que escondia parte de sua boca, parecia ser pequena, só se via o lábio inferior.

Mas dentro daquela boca, cabia a história do universo inteiro, de cada uma de suas criaturas, conhecidas pela história ou não.

Guardava também, a trajetória de cada homem vivente, sobre a face dos planetas.

Seus olhos! Ah ... seus olhos! Não sei por quanto tempo estive a fita-los, hipnotizada!

Quando finalmente, eles começaram arder de tão secos, eu os fechei ... e seus olhos ainda me olhavam, conhecedor de cada uma de minhas dores, sondando cada uma de minhas potencialidades.

Ele estava dentro de minha morada ... e me perguntei se eu seria digna dessa presença em mim.  A resposta foi: por pura misericórdia!





19 
UM OLHAR SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO
“PIMENTA OU ÁGUA BENTA?”
26/11/16


Não conhecia essa espécie de comparação.  Nunca tinha ouvido alguém colocar tão bem - de forma tão sintética - as possibilidades de nos referirmos ao comportamento alheio.  Eu ouvi essa semana.

Devido ao arrastamento humano que temos, de julgamento em relação às atitudes de outra pessoa, vamos correr sempre o risco de sermos injustos.  O ‘outro’  já diz tudo, ‘o outro’ – uma pessoa diferente de nós, não necessariamente divergente.

Olhar o comportamento humano é uma coisa, julgá-lo é outra, e julgar de forma a jogar ‘pimenta’ nele,  é outra bem mais desumana.   A tendência é sempre, engrossarmos as nossas considerações negativas, quando temos algum tipo de reserva em relação ao dono do comportamento.   Se o outro, é alguém por quem nutrimos simpatia ou amor, as nossas considerações a respeito do seu comportamento, serão bem mais compassivas.  Procuraremos colocar uma espécie de ‘água benta’ nelas, no sentido de amenizar a responsabilidade das ações do autor e os seus efeitos negativos. Entre os “dois pesos, duas medidas” – já que é irresistível julgar - que tal usarmos sempre as medidas mais leves?  Afinal, todos nós necessitamos de ‘água benta’ para com as nossas atitudes infelizes.

Fel ou mel, você escolhe.  Mas lembre-se, de que qualquer uma delas, falará do que vai dentro de si mesmo!


Então, o que vai ser?

segunda-feira, 25 de novembro de 2019



66
UM OLHAR SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO
O 'DAR', O 'RECEBER' E AS SUAS MEDIDAS 
25/11/19

Procurei fazer do outro, uma extensão de mim.  Nem sempre soube, como fazê-lo, muitas vezes tentei impor a ele, coisas minhas, sem lhe pedir  permissão, tentando fazer dele, uma continuidade minha - incutir-lhe a minha visão.  Por achar que era meu dever, ou por achar que era assim que funcionava, porque havia funcionado comigo, por ter sido invadida tantas vezes, por acreditar 'ter algo' indispensável a ele - era eu - querendo aumentar meu território as custas do seu, invadindo o seu próprio espaço.  Eu tinha uma noção precária sobre 'espaço', achava mesmo, que estando tão próximos uns dos outros, era óbvio, nos sobrepormos uns aos outros, em alguns aspectos.  Dentro da minha prepotência, acreditava realmente nesse fato, esquecendo-me da individualidade de cada ser.

Hoje eu sei: que de tudo o que o ele me dá, posso acolher como meu, o que me for interessante.  Mas o que dou de mim, pode não lhe interessar, que agregue como seu - e então - ele estará me mostrando, que a regra vale pra nós dois: 'dar' não é igual ao 'receber'.

O que aceito do outro, acrescento ao que já trago comigo, cresço pra dentro de mim, ou pra fora, se eu assim quiser; mas sem que meu crescimento interfira no espaço sutil, que o outro ocupa. Eu estarei crescendo dentro dos meus próprios contornos. Embora juntos, estamos todos, distantes uns dos outros em entendimento, em necessidades, em expectativas pessoais, em merecimento e por aí afora.

Eu simplesmente dou de mim ... o outro simplesmente dá de si - nas medidas respectivas do que possuímos.  Eu recebo ... o outro recebe - de acordo com essas mesmas medidas.


sexta-feira, 22 de novembro de 2019



832 | O QUE PÔDE NASCER | 25/11/18

Na despensa cheia, a fome assolou.
O frio bateu forte, na rouparia repleta.
A tristeza rondou, pela música alta.

Comida, agasalho, coisas palpáveis.
Música alta, fachada: são ouvidas e mostradas.

Na aparência mentida, o sentimento morreu
pela vida fingida, não podia viver.
Alegria e esperança, ao saírem, bateram a porta.
Dessa vida suposta: distância e tristeza,
é o que nasceu.



576 | PERMISSÃO | 25/11/17

Como te permitiste, me perder?
A forçar-me ao exílio
distante e sem volta?

Queria pertencer a ti!
Não havia espaço!

Se assim o fizesse
 necessário seria, dizer todo dia
ao meu coração
de maneira constante
... que ele não quisesse o que queria 
...  que não teria o que tanto pedia!

Quis ser tua
mas eu tinha que antes
pertencer a mim mesma!

E as duas coisas
me foi impossível ter!


   arte | jeremy mann