Fragmentos 370
Efeito perfeito
Tenho madrugadas em que me é impossível
permanecer deitada na cama. Surgem do
nada, não sei de onde - as ideias pipocantes - na panela quente da minha
cabeça, que afastam de vez o sono e ainda se recusam a esperar pela manhã
seguinte pra serem registradas.
As palavras, as frases inteiras,
desfilam num letreiro luminoso em fundo escuro – repetidas e melhoradas – até
atingirem o efeito perfeito de frases perfeitas.
E eu, com receio de perder o ‘efeito
perfeito’, de me esquecer antes mesmo de poder registrá-lo, me levanto e o transcrevo no papel.
Estou em tempo real, sentada à mesa da
cozinha, sinto areia em meus olhos, de sono. São
exatos, dez minutos antes das duas horas, do dia 10 de fevereiro. O relógio da
parede marca um riso em sua face - dez pras duas - o contrário de dez e dez - ele se ri de mim, de minha
condição.
Isso não é normal, já falei a respeito,
em mais de uma oportunidade. Se parece
mais com uma doença, do tipo daquela que faz com que as pessoas confiram
inúmeras vezes o fechamento das portas, o desligar dos aparelhos, o apagar das
luzes.
Depois que as palavras estão no papel,
a necessidade some e enfim posso voltar pro quarto. Sei que só consigo deitar na cama e dormir,
se antes deitar no papel os pensamentos que me atormentam – uma parte de mim
ainda insone.
Desses meus arroubos noturnos, costumam
render bons textos, não tanto por inspiração, mas mais por transpiração. Vocês não têm ideia do quanto exaustivo é!
Esses ataques, invariavelmente, me levam à geladeira, ou ao armário pra ver o que
tem de comestível lá. Necessito repor
minhas reservas noturnas – as calorias que gastei pensando. Não dizem que
pensar cansa?
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