sexta-feira, 22 de abril de 2016




OBRA POÉTICA REUNIDA
Hilda Hilst  (1930-2004)



“                     Da noite - VIII (1992)

        
  ... Costuro o infinito sobre o peito
      E no entanto sou água fugidia e amarga
      E sou crível e antiga como aquilo que vês:
      Pedras, frontões no Todo inamovível
      Terrena, me adivinho montanha algumas vezes
      Recente, inumana, inexprimível
      Costuro o infinito sobre o peito
      Como aqueles que amam ...                                  

                          
*
                               
 Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão" (1974)

Lobos? São muitos.
Mas tu podes ainda
A palavra na língua

Aquietá-los.

Mortos? O mundo.
Mas podes acordá-lo
Sortilégio de vida
Na palavra escrita.

Lúcidos? São poucos.
Mas se farão milhares
Se à lucidez dos poucos
Te juntares.

Raros? Teus preclaros amigos.
E tu mesmo, raro.
Se nas coisas que digo
       Acreditares.   

*
                             
Roteiro do silêncio (1959)
Sonetos que não são I

Aflição de ser eu e não ser outra.
Aflição de não ser, amor, aquela
Que muitas filhas te deu, casou donzela
E à noite se prepara e se adivinha
Objeto de amor, atenta e bela.

Aflição de não ser a grande ilha
Que te retém e não te desespera.
(A noite como fera se avizinha)
Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel
Não saber se se ausenta ou se te espera.
Aflição de te amar, se te comove.
E sendo água, amor, querer ser terra.


 “




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