Quando você usa certas palavras ou expressões nas suas falas do dia-a-dia, não está apenas verbalizando como se fosse um alto falante perambulante. Está emitindo significados muito próprios e profundamente seus, na forma de fonemas ditos aos ouvidos dos outros! É uma linha direta que liga sua alma às demais vivendo no mundo… Este blog quer se dedicar a entender um pouco desse fenômeno! Sejam bem vindos para falar, ouvir e deixar-se tocar por almas que falam!
IRRITABILIDADE
Na verdade em situações específicas fica mais fácil identificar a causa, porém no comportamento humano geral as pessoas sombrias, desconfiadas, de pavio curto, isto é, com limiar muito baixo para as frustrações, com baixa resistência para as contrariedades, pessoas muito pessimistas, podem facilmente identificar-se com situações que lhes provoquem irritabilidade.
CONVIVÊNCIA HUMANA E IRRITABILIDADE
Podemos começar pela apatia?
Podemos chamar de uma insensibilidade afetiva que, segundo estudiosos do assunto não chega a existir completamente em alguma pessoa. É bem verdade que ouvimos frequentemente pessoas se queixando de estarem apáticas, mas estão ainda muito longe de poderem ser, no sentido patológico, de fato, apáticas. O que geralmente acontece é que, quando a pessoa está a certa distância dos acontecimentos e dos envolvimentos afetivos com as coisas que possam estar ocorrendo ao seu redor, já se auto denominam apáticas. Indiferença afetiva como uma completa ausência de “sensibilidade moral” pode ser observada em certas personalidades anti-sociais (psicopáticas), pessoas que podem chegar a um estado em que estejam destituídos absolutamente de compaixão, de vergonha, de sentimento de honra, de remorso e de consciência”. Viktor E. Frankl[1] no seu livro “Em Busca de Sentido” descreve a apatia como dessensibilização do íntimo, que toma conta de uma pessoa, fazendo sua vida baixar a um nível mais primitivo, tornando-o objeto do destino ou do arbítrio de quem os comande ou de quem recebam ordens, destituído de vontade e incapaz de enfrentar decisões e tomar nas mãos o seu destino.
Falamos primeiramente de apatia porque a irritabilidade está, por assim dizer, num polo oposto a apatia, compreendendo dois extremos da afetividade de uma pessoa ou do humor de alguém. É a afetividade que compreende a capacidade de experimentar sentimentos e emoções e determina a atitude geral de uma pessoa diante de qualquer experiência. Quem está apático está distante e quem está irritado está muito envolvido com algum acontecimento. Quem está apático afasta-se de julgar e fica inerte na indiferença, e quem está irritado julga a todos e generaliza conforme o grau em que está a sua irritação.
O que nos deixa irritados?
Ainda segundo Viktor E. Frankl falando dos prisioneiros de um campo de concentração, cita como causa da irritabilidade a fome e a falta de sono. Na verdade em situações específicas fica mais fácil identificar a causa, porém no comportamento humano geral as pessoas sombrias, desconfiadas, de pavio curto, isto é, com limiar muito baixo para as frustrações, com baixa resistência para as contrariedades, pessoas muito pessimistas, podem facilmente identificar-se com situações que lhes provoquem irritabilidade. No dia-a-dia, tudo pode nos irritar, dependendo do nosso estado de humor, desde um simples inseto que começa a zumbir nos nossos ouvidos quando estamos com sono, ou uma pequena abelha que insista em pousar na borda do nosso copo de refrigerante e tantos outros pequenos ou grandes eventos da vida cotidiana. Uma fechada no trânsito não pode ser esquecida entre os exemplos, mas até mesmo gestos, trejeitos, modos e hábitos de uma pessoa podem nos causar irritação. Ficamos irritados, praticamente por qualquer coisa, desde que estejamos também suscetíveis ao que está acontecendo. Por suscetível, entendamos estar expostos a coisas que nos atinjam fisicamente, moralmente, espiritualmente, visualmente, auditivamente e assim por diante.
Fisicamente nos irritamos quando algo ou alguém teima em nos atingir no corpo propriamente, quando somos cutucados ou como um pequeno grão de areia que entra em nosso sapato.
Moralmente quando somos rebaixados na nossa auto estima, quando alguém provoca uma situação em que o nosso amor próprio é ferido ou diminuído. É claro que em todas as situações temos também defesas, mas um dia ou outro, se isso se dá com freqüência, pode nos encontrar vulneráveis o suficiente para nos fazer sentir jogados ao chão ou humilhados, desprestigiados, ou relegados à insignificância.
As agressões morais, especialmente as que nos fazem injustiças, ou quando somos julgados impiedosamente, mesmo sabendo que todos os seres humanos são passíveis de falhas como as que cometemos algum dia em nossa vida, como nos mostrou Jesus[2] quando disse “quem não tiver pecado, atire a primeira pedra”.
Psiquicamaente sofremos os “assédios”, muitas vezes da nossa própria consciência, o diabinho que nos fala aos ouvidos, por exemplo, aquela nossa voz interna que, vez por outra, nos aponta um sentimento de menos valia ou de falta de amor próprio o que pode nos levar para baixo como costumamos dizer, mas também por pessoas, nossas semelhantes que bem podem nos atingir com ofensas ou injustiças, chegando a abalar a nossa integridade.
Visualmente, algo que nos fere o senso de estética, de beleza ou da harmonia facilmente pode prejudicar o nosso humor. Auditivamente como uma música estridente e desagradável aos ouvidos bem como sons altos ou repetitivos, que sejam contrários ao nosso gosto musical ou conforto auditivo, facilmente nos levarão à irritabilidade.
Explicando a irritabilidade[3]
Bleuler[4] considera a irritabilidade como uma predisposição especial ao desgosto, à ira e ao furor. As pessoas irritáveis manifestam impaciência e aumento da capacidade de reação para determinados estímulos e intolerância à frustração, aos ruídos, às aglomerações. Nesses casos, a perturbação consiste no aumento da tonalidade afetiva, isto é, como se os acontecimentos se dessem num tom mais provocador, tanto que se pode verificar certa contradição na conduta das pessoas irritadas, as quais parecem sentir que o ambiente está provocando a sua sensibilidade mais do que as coisas que estão realmente acontecendo. Por exemplo, se estou irritado e alguém liga o aparelho de som em volume alto, tenho uma tendência para interpretar os ruídos mais como provocações do que pelo volume do som. Quando alguém explode, o sintoma principal é a irritabilidade. Nesses momentos um grau elevado de reatividade emotiva, unido a uma extraordinária tensão afetiva, que se descarrega sob a forma de reações de tipo “curto-circuito”, provocando surtos coléricos ou furiosos que põem em perigo a vida de pessoas no ambiente e a integridade de bens e objetos. As pessoas muito irritadas reagem sem compreender o sentido do que ouvem, por exemplo, e respondem com insultos ou atos de violência. Quando, numa situação de conflito a pessoa é levada a superestimar a sua própria personalidade e eleva muito o nível de seus desejos e quereres, observa-se com freqüência explosões de cólera e irritabilidade.
Curiosamente do latim, a palavra “irrito” ao mesmo tempo que significa irritar, encolerizar, tornar furioso, também significa provocar, excitar, estimular. É por isso que falando em irritabilidade falamos ao mesmo tempo em sensibilidade, e como a irritação é uma manifestação da nossa afetividade, estamos falando de alterações da maneira como sentimos os estímulos, frustrações, alegrias, tristezas, enfim o mundo ao nosso redor, e de como reagimos a todos os estímulos tanto negativos como positivos.
Quando os outros nos irritam, ou como disse Jean Paul Sartre[5]: “O inferno são os outros”.
Se pensarmos que, estando Adão e Eva[6] no paraíso, foram induzidos pela serpente a comer o fruto proibido e que havendo duas pessoas fazendo suas oferendas para Deus, Caim e Abel[7], uma das oferendas não foi agradável aos olhos do Criador, podemos ter uma idéia a respeito de tudo que nos causa a convivência, já que o pequeno planeta Terra, hoje está ocupado por mais de 7 bilhões de seres humanos! Por outro lado é na convivência que encontramos nossos verdadeiros espelhos, pois os outros não só espelham a nós mesmos como são capazes de nos fazer discernir e enxergar nuances do nosso ser que passam despercebidas ou são desconhecidas.
Conta-se que um antigo psiquiatra, não se cansava de dizer que a maior causa de aborrecimentos do ser humano é outro ser humano, muito embora dissesse também, que a maior causa de alívio desses aborrecimentos é, via de regra, um outro ser humano. Ao falar sobre a capacidade de nossos semelhantes em nos aborrecer estamos falando das frustrações, mágoas e irritabilidade que, frente aos nossos semelhantes, podemos produzir em nós mesmos. As frustrações, mágoas e irritabilidade, são proporcionais àquilo que esperamos dos outros; quanto mais esperamos, mais sofremos. A respeito disso devemos ainda lembrar que muitas vezes sofremos decepções sem que a outra pessoa saiba nada a respeito. Fazemos verdadeiros decretos dentro de nós envolvendo outras pessoas e com isso as tornamos nossas cúmplices ou exigimos delas comportamentos sem que nunca tenhamos comunicado isso. Passamos a esperar certas atitudes de um amigo, do cônjuge ou de um irmão, simplesmente porque fizemos dessas pessoas nossos ídolos ou modelos e mesmo de objetos de nossa admiração ou fascinação sem que elas mesmas tenham algo a ver com isso. Quando nossas expectativas não são satisfeitas, muito frequentemente agimos como se elas tivessem causado a nós decepções e frustrações. Daí ficarmos irritados na medida em que nem sequer percebemos que essas pessoas foram emocionalmente construídas dentro de nós pelo que esperávamos obter delas e não pelo que realmente um ser humano pode ser capaz de proporcionar de bom ou de bem para alguém. Reside aí uma grande fonte de problemas na convivência e nos relacionamentos.
Leonardo Boff, afirma que “um ponto de vista é apenas a nossa visão a partir de um ponto” Quando julgamos, medimos e assim sentenciamos as outras pessoas. Não levamos em conta o outro como ele é. Só eu e tão somente eu mesmo posso me ver por dentro. Daí decorre que a maneira como me reconheço no íntimo, me torna exclusivo. Mas decorre também que as outras pessoas, em hipótese alguma podem me ver como realmente sou. Como canta Almir Sater em “Tocando em Frente” “Cada um de nós compõe a sua história, cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz”
Portanto, sem espanto, está posto que cada ser humano descobre suas próprias formas de encarar a vida, pois cada um tende a usar suas oportunidades vivenciais, para tornar-se tudo aquilo que o leva a ser um “eu individualizado”. O nosso modo de existir no mundo em que vivemos, nos permite avaliar e reavaliar cada momento, apreciando primeiramente nossas singularidades para que fique mais fácil e possível perceber singularidades ao nosso redor e na nossa convivência.
[1] Viktor E. Frankl (1905-1997) foi professor de Neurologia e Psiquiatria de Viena. É o fundador da Logoterapia. Publicou 32 livros traduzidos para 27 idiomas incluindo o chinês e o japonês. Esteve no Brasil em 1984.
[2] Passagem sobre a mulher adúltera registrado no Evangelho Segundo João, cap. 8, vs 1-11.
[3] Os conceitos sobre irritabilidade deste artigo foram obtidos emBallone GJ – Convivência com o Próximo in. PsiqWeb, Internet – disponível em www.psiqweb.med.br, revisto em 2005.
[4] Paul Eugen Bleuler, nasceu e morreu em Zollikon,30/04/1857–15/07/1939 e foi um psiquiatra suíço notável pelas suas contribuições para o entendimento da esquizofrenia.
[5] Jean Paul Sartre, (1905-1980) filósofo existencialista francês.
[6] Ler no livro do Gênesis, o primeiro livro da Bíblia Sagrada, o capítulo 3.
[7] Idem, no capítulo 4 vs. 8-16.
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