As ciladas da ajuda
...A pessoa que tem a “boa” intenção de ajudar também tem a necessidade de controlar.
Ela acha que no fundo tem o poder sobre o destino do outro e a responsabilidade de “consertar” os fatos e as pessoas. Tem a ilusão de achar que se não fizer algo naquele momento para aquela pessoa, se não estiver ali para olhar e cuidar de tudo, as coisas não irão se resolver. Essa necessidade de querer controlar tudo também esconde uma falta de fé nos mistérios da vida (em Deus, no Universo, como quiser chamar) e na capacidade de autorregulação e equilíbrio da Natureza.
Bert Hellinger, filósofo criador da Constelação Familiar, certa vez fez uma afirmação bastante forte: os médicos morrem cedo. Essa constatação tem a ver com a “boa” ajuda. Explico melhor a seguir. Muitas vezes a doença é um portal para o autoconhecimento, para olhar algo que estava oculto, para se libertar de algum sofrimento, de curar algo no nível profundo da alma. E quando alguém tira da pessoa a oportunidade de aprendizado que ela teria por conta própria, impede assim que uma lei natural aja sobre ela. Como colocou de maneira muito clara o escritor e terapeuta Bruno Gimenes, se a pessoa teve uma ajuda externa, mas não mudou a consciência e a postura interna diante da vida, esta energia de mudança que era necessária para aquela pessoa acaba se voltando para quem a ajudou. Então por isso, quem ajuda experimenta um sofrimento que não era seu. Fica emaranhada com o outro – como dizemos na linguagem das Constelações. E se desvitaliza. Essa mesma dinâmica também se observa nos profissionais que trabalham com a ajuda e com o destino das pessoas, como psicólogos, terapeutas e advogados.
A verdadeira ajuda é ajudar sem ajudar.
A frase parece um paradoxo, não? Mesmo que alguém peça ajuda, é necessária muita sabedoria para entender qual é o jeito certo de ajudar. O caminho para isso passa por uma mudança de postura interna. Um novo jeito de olhar a vida. Exige um aprender a soltar, a entregar o problema a uma força maior que a sua – e confiar. Significa ajudar sabendo que por trás daquela doença apresentada pelo paciente há um mistério, algo maior, que pode ser um reflexo ou resultado de alguma desordem na história de vida daquela pessoa ou do sistema a que pertence. É necessário aprender a respeitar tudo isso e se colocar, internamente, na postura de: “Eu sou muito pequena diante de tudo isso”, “Isso tudo é muito maior que eu.”
Então, como médico, advogado ou terapeuta, o aprendizado está em saber até onde se pode interferir e ajudar. Fazer o que está ao seu alcance como profissional e sair, virar as costas e deixar o que é do paciente com o paciente. Os médicos que já se aposentaram sabem do que eu estou falando.
“Ajudar é ajudar sem ajudar.”
http://aliceduarte.com/2015/10/01/as-ciladas-da-ajuda/
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