sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

 1559




AMANHÃS

Eu vi o tempo passar, diante dos meus olhos, até eu confundir os dias e meses entre si, em sobreposição, debaixo do meu nariz.  A inicial empolgação e ansiedade pela proximidade de finais de semana, deu lugar ao temor, quando uns, começaram a se encostar aos outros, me deixando sem tempo de fazer o que precisava ser feito, nos outros dias da semana.

Pensei que os dias me pertenciam, na verdade, eram eles que me tinham sob controle, pela velocidade com que rodavam, numa ciranda frenética.  Nem sei quando comecei a dar conta disso, nem quando acordei para o fato, de estar cada vez mais perto do fim e mais distante do começo. 

Vendi muito ‘hojes’ para comprar ‘amanhãs’, barganhei para adquirir ‘pacotes’, que nem sempre me foram entregues como o ‘esperado’.  Ah ... quantas vezes, comi cru e deixei esfriar uma delícia macia!  Por coisas ‘futuras e incertas’, desprezei os ‘presentes’ que tinha em mãos, para tentar agarrar balões imaginários.

Hoje, respeito o meu próprio tempo, já não corro mais ao encontro do tempo, relaxo e deixo que ele me encontre, ao tempo dele, num encontro mais casual.  Já não tenho mais pressa, ando com pés firmes, sobre as calçadas irregulares e perigosas, com atenção onde piso, sem ignorar as belezas do meu entorno, é claro!

O tempo passou sobre mim, como um rolo compressor, como passa por cima de tudo, quebrou a postura enrijecida do ego.  Ele mostrou que as pequenas desilusões não foram resultado de escolhas mal feitas, nem da minha incapacidade de realizar vontades, mas por ter alimentado expectativas, exageradamente.

Fiz o que pude e o que deu, cheguei até onde consegui ir, e em todas as vezes que quis fazer ou ir além, ignorando meus limites, paguei o alto preço, de carregar excesso. O peso que carrego hoje, equivale ao peso do meu casco: de ossos ainda intactos, da carne um tanto gasta e da consciência, que não sinto pesar.



quinta-feira, 22 de dezembro de 2022


1558



A TERRA E O SOPRO

Não nascemos da terra molhada, que obedecendo à geometria sagrada, formata a nossa imagem, seca e oca - da terra, apenas nos formamos.  Nascemos, de verdade, quando o Criador inspira em nossas narinas de barro, seu sopro divino, com o ar da vida, e então passamos a existir de fato, em essência, dentro da forma.  Assim seguiremos, durante toda uma existência, deixando que entre e saia, o ar primordial, alimento e conservante do barro; até que no último expirar nosso; devolvamos à terra, o barro já um tanto gasto e à atmosfera, o ar usado e desnecessário, depois disso.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

  1557




A METADE DO CAMINHO

Não dizem que ‘o primeiro passo é meio caminho andado’?   De acordo com a aritmética mais elementar, esse dito não condiz com a realidade; mas se analisarmos o quanto ele é importante, a frase ganha sentido; porque ao darmos o primeiro passo, algo acontece na nossa determinação; tudo tem muito mais a ver com direcionamento e vontade, do que com distância ou tempo.

O movimento quebra a inércia e indica que uma escolha foi feita, de seguir adiante, em determinada direção; indica também outras tantas possibilidades, das quais nos afastamos por serem inviáveis.  Uma força propulsora toma conta da vontade e disposição de atingirmos um propósito, seja ele qual for.  Mesmo se, não soubermos exatamente, qual o destino final ou se não permanecer no lugar, seja o propósito inicial; damos a permissão à vida de nos impulsionar, porque às vezes, ela só espera de nós, um mínimo movimento, de vencermos a estagnação, de abrimos uma porta, há muito tempo fechada, para que ela possa fazer acontecer o que precisa fluir.



sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

 1556




ENTRE O SIM E O NÃO 

Já não sei, se és o oxigênio que me falta ou se o ar que me sufoca.  Espremo a estória, pra contar-te entre os vivos; mas às vezes te mato, ao rasgar as folhas escritas.  Tenho ganas de levar-te à minha casa; quando não, sinto o alívio de não ter que fazê-lo.  Fico preso entre o ‘possível sim’ e o ‘não improvável’.  Já nem sei o que digo, nem o que sinto.  Finjo não me importar, mas no fundo me mordo.  Concluo que ao final, oxido minhas células, por demais.

Coleciono pequenas esperanças, pra depois vê-las escorrer por dedos transparentes. Desliso sobre a linha que une os dois polos opostos, com a mesma naturalidade do pêndulo que marca o tempo, com movimentos repetidos e monótonos.  Danço uma dança de pouquíssimos passos, cansativos e parassimpáticos, ora em cima, ora em baixo, como se não houvesse controle.  Essa gangorra de emoções me consome e me mata, aos poucos.

Não me decido, se ‘’sim’ ou se ‘não’, fico a maior parte do tempo, no meio do caminho, tão distante de um quanto do outro – como se buscasse um equilíbrio que não existe.

E ao contrário do pêndulo, que desenha no espaço, uma curva côncava e alegre ... eu registro um zigue-zague louco - apenas um sobe e desce frenético; traço um rabisco grosso e nervoso, de um risco sobre outros - num vai e volta, gastando sapatos e consumindo energia, sem chegar a lugar algum.


arte | agnes cecile

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

 1555




NINHO SEM PASSARINHO


O ninho que esteve quentinho, agora está desocupado

deitou fora o passarinho, que se tornou emancipado.

Mas o ninho não está vazio ou frio, está quente de alegria!

Passarinho usou asas viçosas, para encarar o desafio.

Em seu voo eu experimento um novo sentimento

vejo o mundo, na carona de suas asas poderosas!


arte | ottokim


domingo, 11 de dezembro de 2022

 1554



 FANTASIA 

A vida não é cruel, ela é justa, numa justeza dolorida, porém honesta. Expectativas forjam uma ‘realidade paralela’, muito diferente da real situação. Porque a criamos e alimentamos com todas as forças, em vermos concretizada nossa vontade – e dentro da nossa visão limitada e tendenciosa, ela nos convence de que é 'verdadeira'.

Nos tornamos escravizados, pela criatura a que demos vida.  Sem condições de enxergar as distorções, incongruências e incompletudes da nossa criação, seguimos confiantes na versão que idealizamos.  E como seguir um caminho, significa renunciar outros; recusar-se a ver a realidade é entregar-se à impossibilidade de realizar o que tanto desejamos, porque estaremos nos distanciando, do que é imprescindível de ser considerado. 

Expectativas se ligam mais aos desejos – ao mundo da imaginação, do que à realidade real e concreta.  É fantasia confeccionada sob medida, por nós e para nós, na realização das nossas necessidades e anseios.  Ao escolhermos deixar de ver, o que muitas vezes, está ‘na  cara’, aceitamos nos deixar levar pelo quimérico, pela consequente e certa exposição à frustração - um caminho inverso ao que pretendemos.


arte | katie o'malley

quarta-feira, 30 de novembro de 2022

 1553




SEMPRE EM MOVIMENTO

As ladeiras são boas para testarem nossos pulmões, fortalecem os músculos das pernas e comprovam a nossa determinação, de chegarmos ao destino, embora este, esteja num nível mais alto – um excelente exercício aeróbico de superação de forças.

As mesmas ladeiras, quando as descemos, são úteis para porem à prova, o equilíbrio e sustentação do nosso corpo, porque é preciso controle para não descer rampa abaixo, numa velocidade perigosa.  Encontrar o rítmo seguro é um bom exercício para o freio de descida, quando ao peso do corpo se junta a força da gravidade.

Os trechos planos, sejam sinuosos ou retos, também exigem de nossa parte, uma vontade firme, na resistência e persistência na continuidade da marcha; porque estes, podem ser cansativos, ásperos, monótonos, intermináveis; e tanto quanto as ladeiras, também testam a nossa coragem e disposição, de atingimos o objetivo.



segunda-feira, 28 de novembro de 2022

 1552




CASA E BOAS CERCAS

Com medo do frio, usei o cobertor pesado e rude.  Por temer as águas revoltas, morri de sede.  Na fome, aceitei migalhas, alimentei-me de coisas indigestas, enquanto a alma permanecia faminta e o corpo desnutrido.

Em busca por segurança, com grilhões e correntes forjei a servidão.  Sem coragem para dar um passo, fiquei onde já não estava mais.  Na falta de limites, vi meu jardim ser pisoteado ...

Mas os ventos gelados vieram e me arrancaram de onde estava plantado; submergi fundo, sem tempo de armazenar ar; fui jogado contra os limites do outro; passei por todo tipo de privação.

Ao me ver em terra, desperto, descobri a liberdade e os ares puros.  Agora, moro em casa própria e constatei que posso fincar raízes onde quiser.  Teço meu próprio agasalho; aprendi a fazer uma concha com as mãos e beber da água doce do meu terreno; do jardim saem os aromas e gostos.  Aprecio o horizonte e minhas cercas enfeitadas, bem definidas, transpostas, apenas por mim.


sábado, 26 de novembro de 2022

 1551



A GRANDE MENTE

Já não era um único coração batendo, eram minúsculas bombinhas, nano-corações, pulsando por todas as artérias e veias - um coração difuso, de vida abundante, levando e trazendo mais do que sangue, transportando consciência a todos os espaços, por mais escondidos.

Aprendia que enquanto pulsava, respirava presente em todos as células, tecidos, órgãos e sistemas.  E enquanto se fazia presente em cada pontinho, permitia às pequenas partes, sentirem da mesma forma, como sentia o grande coração, conciso e localizado no meio do peito - uma explosão de sensação, emoção e sentimento à flor da pele, percepções desconhecidas até então. 

Foi um exercício muito breve e não usual, mas serviu ao propósito de revelar, como seria ter um coração pensante, em cada terminação nervosa, em cada um dos sentidos, em cada ponto mais remoto.  Assim, o corpo físico deixaria de ser só físico, passando a ser um ser pensante, sensitivo, capaz de apreciar espaços físicos, emocionais, vibracionais, sem precisar esbarrar ou invadir outros semelhantes a ele.  Agindo como uma grande mente, sabedora e respeitadora das individualidades dos seres de toda a criação.  Desse jeito, a mente não mais mentiria, nem o coração se enganaria, estariam os dois, num perfeito equilíbrio de razão e sentimento.

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

1550 




UM SÓ

À beira do caminho, eu tantas vezes em terra, me deixei levar pela emoção de ver coisas lindas e também por coisas tristes.  Uma vez em mar e sobre ele, mais precisamente, apesar do medo de sua imensidão, foi impossível não juntar algumas gotas salgadas, vertidas por mim, às colossais águas que meus olhos viram.  Brotaram de uma profunda gratidão, nascida do mais íntimo do meu ser, talvez de uma saudade enrustida e remota, por estarmos tão distantes, por tanto tempo. Foi como, se uma súbita simbiose tivesse ocorrido entre o mar e eu - e o seu sal chamou o meu, foi assim que nos entendemos.  Num misto de temor e adoração, como se em mim aparecessem nadadeiras e brânquias, por uns instantes apenas, eu pude me ver debaixo da superfície da água, e sem me afogar, éramos um só. 



sábado, 12 de novembro de 2022

 1549




PÃO E RAZÃO


Parecia que na casa faltava pão, mas o que faltava era educação.

Todo mundo gritava sua razão e em cada grito, mais abrasão.

Cada um dava vazão a sua deseducação, que só piorava a situação.

Nessa louca conversação, ninguém se entendia, era zero comunicação!

E à conciliação, entre berros de persuasão, só restara a evasão!




quinta-feira, 10 de novembro de 2022

 1548




ENTRE OS MEUS VIVOS

Tenho certeza de que a poesia ainda mora em mim, que se demora, em algum cômodo, adormecida ou ensandecida.  Mas como incômodo, sinto essa repentina sensação de ausência ... ao que reajo, com uma desesperada teoria, em que defendo a 'anticoncepção' de sua falta.  Está mais para desconhecimento do paradeiro, do que para sua efetiva inexistência.  Porque sinto que ela não desabitou a minha casa, que resiste bravamente.  Sei que embora me falte palavras para dizê-la, as vísceras se retorcem, os nervos se contorcem - os seus aliados declarados - como a gritarem a mim, por uma única sentença, curta que seja, mas que traduza esperança. Permanece aderida ao meu ser, um tanto letárgica, mas eu a conto entre os meus vivos.  

Devo então, fazê-la despertar ou sair de um ostracismo involuntário, talvez voluntário. Devo busca-la, na cela em que se encontra; retirar-lhe a mordaça, que lhe nega voz; desfazer os nós que prendem os movimentos, dizer que goza de juízo perfeito e trazê-la pelas mãos, à luz de um dia ensolarado.


arte | anne soline


segunda-feira, 31 de outubro de 2022

1547

 



ESTES SÃO

Dias, em que o ar usado dos pulmões não consegue sair por completo, para que o novo possa entrar; porque parece preso de alguma forma, pela indignação que obstrui todos os condutos respiratórios.  Também dias, em que o estômago congestionado, não dando conta de digerir os sapos apodrecidos, engolidos forçosamente, fica incapacitado de receber, mais algum outro suprimento.  E muito antes disso, a boca padece de um fenômeno estranho, um gosto amargo e rançoso, causador de repulsa e náuseas, sem nem ao menos ter ingerido nem um naco de coisa sólida ou líquida.  

Espasmos intermitentes e violentos machucam a faringe, nas tentativas de vomitar o que é indigesto.  E mesmo assim, padeço de fome, de fome de justiça, numa vontade comichosa de pegar nas goelas, de dar uns cascos, de rasgar o verbo - o que absolutamente, não resolverá nada, porém, esta reação é instintiva, humanamente concebível e natural!

Pegar quais goelas? Cascar quem?  Rasgo assim, a mim mesmo, quando fecho a minha própria traqueia, sem poder gritar o que quero!  Casco em mim, a sofreguidão de negar ar novo aos meus alvéolos!

Incrível e revoltante ver, que existem consciências 'autolimpantes" - transferem para fora, toda a responsabilidade que lhes cabe e a despeito de todo o rastro de destruição, deixado na sua passagem ... dormem tranquilos – o sono dos justos.  

Tudo isso é muito maior do que eu posso ver ou entender, é demais para mim ... e dessa forma, o único alvo que atinjo é o meu sistema nervoso ... ao tentar modificar algo, que minhas mãos, não têm o tamanho suficiente para alterar e minhas forças, não têm poder para fazer diferente.


sábado, 29 de outubro de 2022

 1546



OS SAPATOS, OS DENTES  E O MARTELO 

Eu criei a verdade, à minha imagem e semelhança.  E à qual outra poderia ser, senão aquela que conhecia!?  Inventei-a com os ‘olhos’ que tinha, mais astigmáticos do que os meus próprios olhos de carne, limitados pela dificuldade de focalizar e à consequente distorção que ela causa nas imagens vistas.  De verdade - considerando a relatividade da minha visão, por ser incapaz de alcançar a totalidade de imagens concretas, o mesmo se deu com as abstratas - foi uma construção imperfeita e incompleta, com um número bem menor de facetas – mas foi aquela que eu ‘queria ver’ e sobretudo, aquela que eu 'podia ver'.

Eu sempre intuía, que ela não era plena, nem de longe e menos ainda, de perto!  A todo instante, eu sentia a 'menos inverdadeira', a me perseguir, tentando comer meus calcanhares.  O tempo todo, era perceptível, que eu insistia, em usar um sapato menor do que o meu pé.  Mas o que eu não poderia supor, é o quão estreita era a minha visão, que me mantinha distante da realidade dos fatos.

Hoje, não tenho pretensões de julgar, que posso ver com mais clareza, nem que minha visão tenha melhorado, mas sigo com mais atenção, quantos aos sapatos que calço; e a cada vez que sinto meus calcanhares sendo mordiscados, pelos dentes da verdade, procuro dar ouvidos ao que a sua boca tem a me dizer.  Como os olhos são os mesmos, aprendi a não bater mais o martelo, como antes; porque quanto mais se bate o martelo, mais a verdade se quebra em múltiplos fragmentos, estes se espalham e escapam do meu campo de visão..



sexta-feira, 28 de outubro de 2022

 1545





MÉRITO PURO

Impermanência não combina com inconsequência.  A ‘consequência’ está diretamente ligada, à forma e ao funcionamento impermanentes da natureza humana.   O coroamento de louros ou de espinhos é o seguimento, obtido depois de todo o movimento, feito com base na dinâmica de erro e acerto, a única que conhecemos.  

No caso de premiação, a incorporamos como conquista.  Quanto a mais um erro contabilizado e à mensagem ‘game over’, agregamos em nosso aprendizado, mais uma maneira de como ‘não fazer’.  

E para que ‘assim pudesse ser’ – nos apropriarmos das vitórias buscadas - é preciso percorrer um caminho tortuoso, íngreme e rude, permeado por todo o tipo de intempéries e limitações, que ao certo não sabemos, se são dificuldades exteriores ou se nossas.  Uma somatória de adversidades a serem vencidas, que quando as vencemos, é louvável, que consideremos como vitória.


quarta-feira, 26 de outubro de 2022

 1544




TROCANDO DE PELE

De tudo o que suporto, de tudo o que é preciso de ser encarado, vejo a grandeza e força das minhas ações e passos - chego à conclusão de que minha fraqueza é forte.  Há um certo glamour, em 'apanhar de pé', como a dizer: “ali onde chorei, qualquer um chorava!”!!!  Reivindico o direito de me sentir momentaneamente fraca, se assim eu escolher, mesmo após assumir a postura de ser forte ou até, se a legitimidade parecer não existir.  

Resisti, resisto e resistirei à duras penas ou à suaves!  Afinal, o que posso fazer, além de aceitar aquilo, a que não consegui reverter seu avanço(!), nem mudar sua direção(?) ... e passou sobre mim, como um rolo compressor, pulverizando minha consistência e me fazendo ‘chorar na rampa’, a lamentar certezas desfeitas.

Chorei, mas do pó me refiz e retornei em matéria e espírito, para seguir adiante, reconhecendo que como eu, todos estamos nos refazendo a todo instante, adquirindo o tamanho e a envergadura que a vida exige de nós.  

Vamos assim, salgando a terra, criando nossas novas versões, trocando as velhas peles, escrevendo outras histórias nas novas ... com base em nossos anteriores moldes, tornados envelhecidos e inúteis.


segunda-feira, 24 de outubro de 2022

1543



SI NO FUERA ASÍ

¿Y si no viniéramos de las estrellas?  Si no hubiera pequeños portales, entre esta dimensión y la otra imposible haber pasado a través de ellas, las pequeñas partículas de polvo que originan nuestros cuerpos ... no habría materia, y entonces el espíritu no tendría dónde morar. De lo contrario, la vida tal como la conocemos no podría concebirse.

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

 1542




BOLAS DA VEZ

Hoje eu preciso, desesperadamente, falar sobre amenidades. É a minha tentativa (e espero que seja ‘acerto’), para desfocar a minha atenção, de um assunto que me consome, e direcioná-la para coisas mais leves.

Na esperança de deixar de sentir a natural indignação e impotência (que podem nascer em qualquer ser humano), eu não darei tratos ‘às bolas da vez’.  É certo, que isto queimaria minha saúde física, emocional e energética.

Eu fui de 8 e 80, não de 8 a 80, porque fui de ônibus e metrô, e não tão rápido. Fiquei o tempo todo com aquele olhar perdido, de vidraça - próprio de quem olha e finge que não vê ... porque não vê mesmo. Por ser desagradável encarar as pessoas, nos condicionamos a olhar através delas, em direção ao que parece ser um vazio, e nos damos conta, de que olhamos para dentro de nós mesmos. 

Ainda, desviando o foco do real e crucial problema que me atormenta; reparei que tinha a barra da minha calça dobrada para fora, contrariando a moda; aliás, prefiro isso a vê-la arrastada pelo chão.   Antes a inadequação, do que esfarrapar o tecido, de uma roupa que vai durar para além dessa tendência.  Mas como tudo o que aprendemos, uma hora ou outra, é considerado inadequado, sei que posso ter passado a ideia de desatualização ou ridículo ..., porém não estou 'nem aí' ... para uma questão tão frívola - de como considerarem, a maneira de me vestir!

Mas não é tão fácil, uma sensação me persegue, de estar dentro de uma ampulheta: quando acho que estou na parte de cima, vejo que já passei para a parte de baixo!  Quando os valores transpõem o pequeno orifício, são espremidos, invertem-se os pesos - o que era certo, antes, já não é mais, e com que rapidez(!), que é impossível acompanhar.  De 8 a 80, num piscar de segundo!

Confesso que muitas vezes, eu salto da parte de baixo da ampulheta, direto para dentro de um liquidificador em funcionamento ou sou passada sobre um ralador bem afiado ... e isso o que eu digo, é obvio(!) ...  que não envolve questões sobre moda! 


segunda-feira, 17 de outubro de 2022


1541A



O ALVO E A POEIRA

Não sou responsável por resgatar ninguém, sobretudo quando não quer ser resgatado. Posso dar minha humilde contribuição, se me for pedida ou quando ... o comportamento inadequado do outro, me envolve diretamente, e é preciso me posicionar a respeito - para que eu não venha a ser arrastado pelas consequências partilhadas. Assumir questões que não são minhas, é morder um naco maior do que eu posso mastigar, e caso eu consiga engolir uma pequena parte, esta descerá pela garganta, raspando e machucando, sem jamais ser digerida.

Na ânsia de minimizar ou tentar alertar o outro, sobre um iminente desfecho negativo; quando não sou ouvido ou nem sequer há consciência dele da necessidade de mudança; e além de tudo, ridiculariza minha intervenção ou tenta 'redirecionar o alvo' - é preciso que eu sacuda a poeira das minhas sandálias, me afaste da situação e siga o meu caminho - porque esse pó, caso não o retire, será danoso aos meus pés.  Cessa aqui, toda e qualquer possível parcela da minha responsabilidade.

Tenho o direito de me colocar, quando algo invade a minha integridade física ou moral; pois limites são bons, como são bons, os muros que separam as propriedades. Se assim não fosse, não saberíamos onde termina o meu quintal e começa o do outro.  Se serei compreendido ou não, não me cabe a preocupação, nem me importar como ele vai se sentir.  É importante ressaltar aqui, que os ‘invasores de propriedade’ têm dificuldades em reconhecer os direitos alheios, porque trazem uma visão bem distendida dos seus próprios limites.
















sexta-feira, 14 de outubro de 2022


1541 






CHAVE PERDIDA

Qual é a pior escuridão?   Qual é o mais terrível silêncio?  Qual é a maior distância?  Não é a dos olhos que não veem; não é a dos ouvidos que não ouvem; nem a dos corpos afastados.

Um coração que não sabe enxergar o quanto o outro se esforça, que não se compadece do sofrimento alheio; nem se atém a ouvir o que um outro coração diz; nem sentir o que um outro sente – o dono desse coração, esse sim, é o verdadeiro cego, um surdo sem esperança e um insensível, impossibilitado de exercer suas habilidades humanas.  Nega acesso a qualquer troca, incapaz de dar de si quando é preciso, também não consegue receber nada de ninguém – porque seu peito permanece trancado. Acaba por adquirir algumas características inumanas.



quarta-feira, 12 de outubro de 2022

 1540




ANALFABETISMO EMOCIONAL


Ser analfabeto das letras é terrível, porque nos priva de adquirir conhecimento a respeito de quase tudo na vida.  Bem pior do que ele, é o analfabetismo emocional, porque nos rouba a chance de termos relacionamentos saudáveis e duradouros.

São as emoções que nos dirigem, têm como gatilho, situações atuais, que acordam experiências semelhantes, vividas anteriormente - sensações que estiveram, até então, abaixo da linha do consciente, que se somam à reação ao fato atual.

Toda troca é feita com base no consenso, ou seja, o manipulador exerce sua influência sobre o inseguro; o dominador se sobrepõe ao fraco e assim por diante.  Haverá sempre um ganho, ao se deixar manipular ou dominar, porém a relação não deixará de ser tóxica.  Durará até que a parte prejudicada se dê conta do ‘jogo’ e resolva não ‘brincar mais’.

Salvo as pessoas, que não se colocam no lugar do outro, por absoluta e inata ausência de empatia, devido suas personalidades específicas e com tendência psicopática; há sempre a possibilidade de melhorar os relacionamentos. Desde que as duas partes percebam a necessidade de mudança e estejam dispostos a fazer os ajustes, é possível.  

Normalmente, nos relacionamentos doentios, demora um tempo até que se perceba a disfunção, e quando isso acontece, a parte que exerce poder não quer modificar sua dinâmica, pois esta, está baseada na subjugação e sem ela, não concebe nenhuma outra possível maneira de se relacionar.





segunda-feira, 10 de outubro de 2022

 1539




SOMANDO ZEROS


Quando é que fazemos isso?  É preciso lembrar que na soma, o zero não acrescenta nada; na subtração também, nada se altera.  Na multiplicação, ele torna nulo todo o valor anterior ou posterior; na divisão, qualquer número, como dividendo ou divisor, perde seu peso, porque é um cálculo impossível de se fazer.

Mesmo sabendo disso, inúmeras vezes, somamos zeros, na esperança de acrescentar ou fazer a diferença, numa determinada situação.  Quando o produto da operação já está definido, somar zeros, é coisa improdutiva, porque quantos mais forem somados, não alterarão o resultado.

Falando assim, sobre aritmética, todo mundo sabe do valor do zero.  Agora, quanto àquela situação que nos incomoda e desafia, nem sempre temos essa ideia muito clara em nossos comportamentos.  Não transportamos o conhecimento que temos, de uma regra, também  aplicável às atitudes que podemos ter, perante algo que precisa ser mudado.  

Perdemos nosso precioso tempo, tentando modificar um resultado desfavorável, com opções impossíveis, com passos já reconhecidamente, como infrutíferos.  Será que devemos retornar à escola básica para reaprender a fazer contas? 



domingo, 2 de outubro de 2022

 1538





AS MUITAS PELES 

Como todo ser vivo, precisei de duas metades que se ajustassem uma à outra, para me corporizar por aqui.  Depois de concebida, ganhei formas humanas, me alimentando indiretamente das substâncias, e de sentimentos, que tomei como meus.  Aos poucos, todas as partes, foram se desenvolvendo e crescendo, até que cheguei à forma primária de minha constituição física e à forma inicial de minha estrutura emocional.  Nesse momento, eu havia recebido tudo de que precisava, para dar continuidade à história única, que começara e escrever.

Precisei de um bom tempo ainda, para aprender a caminhar com minhas pernas (no sentido mais amplo da emancipação) ... maior tempo ainda, para treinar a pensar com a minha cabeça, porque no começo, eu não pensava, só sentia.  Tudo que aconteceu ao meu redor, contribuiu para o meu fortalecimento; todos que cruzaram ou que dividiram o mesmo caminho, também contribuíram com experiências, que agregaram aprendizado.  Era forçoso, que meu caminho fosse descoberto, personalizado para os meus propósitos.

Nunca estive só, porém era preciso que eu pessoalmente, me desse à luz, parisse a mim mesma, na versão concreta da verdadeira construção - entronizada de tudo o que havia me afetado, até ali.

Confesso que foi um parto difícil, com contrações dolorosas de músculos ainda fracos, comprimindo e convulsionando, as ideias necessitadas de amadurecimento, mas que tinham que corresponder ao que se exigia deles – a transformação da essência bruta em resultado mais apurado.   Sempre é preciso abandonar as velhas peles, porque não comportam mais as células renovadas, nem os velhos conceitos, agora com outros significados.

Do primeiro parto – o verdadeiro, eu não tenho lembrança vívida, apesar de tê-lo vivido.  Do segundo, trago gravado todas as dores, a respiração ofegante, a sensação de medo e desespero de não ser capaz de concluí-lo.

Foi um parto, onde ao mesmo tempo, fui a parturiente, a assistente e o próprio fruto.



terça-feira, 27 de setembro de 2022

 1537




SINCERAMENTE

Depois de um bom tempo (e bota ‘muito tempo’ nisso), aprendi que não devo usar um balde maior do que a minha capacidade de carrega-lo cheio.  Também aprendi, que não importa o que eu mostre ao outro, ele verá sempre, o que ‘consegue’ e o que ‘quer’ ver.  Se eu insistir em usar recipientes maiores (e isso vale tanto para dar, quanto para receber), terei sérios problemas com meus braços – ficarão escangalhados num caso e paralisados no outro, à espera.

Esmiuçar demais um assunto, ficar justificando meu posicionamento ao outro, para que venha entender minha ideia, é gastar vela boa, com defunto ruim.  Quem não deseja entender, dispensa as mil palavras que se possa dizer; porque quem quer mesmo entender ... ah! ... essa pessoa, se esforça de verdade, e com bem menos palavras (às vezes nenhuma), é capaz de captar muito mais do que se pretendeu dizer.  Atenta ao olhar, ao gestual, estará considerando os sentimentos envolvidos.

Ninguém tem jurisdição, para determinar pena alguma ao outro, nem para mantê-lo ajoelhado no milho, por tempo além do necessário à reflexão e posterior arrependimento.  Ninguém é juiz de ninguém, a não ser de si mesmo.  Ninguém é objeto que se possa dispor, para extravasar a agressividade ou o sadismo alheios.



segunda-feira, 26 de setembro de 2022

 85




UM OLHAR SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO 

UM TRABALHO PARA DOIS


Nunca, o trabalho para atingir o êxito de qualquer relação, entre duas pessoas, é apenas de um só.  Em todo relacionamento, seja amoroso, familiar, de amizade, existe a responsabilidade partilhada entre as partes - 50 por cento de cada lado.  Cada um se relaciona da maneira que lhe é própria, determinada pela sua personalidade, suas crenças e dinâmicas estabelecidas nas suas vivências.  Sem perceber, levamos para os nossos relacionamentos adultos, conflitos anteriores, que se expressam na dificuldade de interação com o outro.

Nem sempre, a comunicação flui de maneira tranquila, porque os empecilhos que surgem, muitas vezes, têm raiz em fatos desconhecidos sobre nós mesmos, aos quais não associamos o nosso comportamento - via de regra, ligamos a dificuldade de relacionamento à outra pessoa e ao contesto atual.  Responsabilizar o outro, colocando toda a carga nas costas dele, é ignorar a nossa participação, nesse entendimento fracassado.

As relações humanas não são coisas estáticas, elas precisam se adaptar, constantemente, sob pena de se deteriorarem, caso nada se faça a respeito. Uma vez, detectado o problema ou a falha desfavorável à boa interação, é necessário algum movimento, no sentido de minimizar as diferenças e se chegar ao meio termo, num acordo de senso comum.  A confiança e a reciprocidade devem alimentar a sua continuidade. O respeito deve ser a base de toda as alternativas, aplicadas pelo desejo sincero e mútuo de dar vida nova à relação, com a estreiteza no entrosamento, levando a vínculos mais fortes.  


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MOSAICO

Vi desejos grudados aos arcos invulnerados dos altos tetos.  Reentrâncias, de pedra resistente ao peso vertical da arquitetura, concreta o bastante, para barrar o vôo impetuoso dos sentimentos e quebrar suas asas.  Antes, seres alados, agora, organismos cativos, voaram até onde lhes foi possível e chocando-se contra a superfície rústica, lá permanecem grudados.  O chão forrado de pequenas e grandes asas, transparentes e partidas, me lembram pedaços de vidro multicolorido, formando um imenso, brilhante e indecifrável mosaico, sobre o qual meus pés, agora pisam.


sábado, 24 de setembro de 2022

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OPÇÃO IMPOSSÍVEL

Control Z’- não podemos aplicar essa ação na nossa vida, quando nos arrependemos de uma atitude, esta saída é inconcebível.  Passo dado é passo andado, voltar o pé, nesse caso é coisa inviável.  Todo movimento determina um direcionamento, que exclui possibilidades outras e gera automaticamente, consequências pertinentes à escolha e não reversíveis.

Na pior das hipóteses, no resultado mais caótico – ‘reversão’ aos atos é recurso que não se aplica.  A vida flui para frente, como a água corre para baixo e só sobe, se impulsionada por algum mecanismo ou em temperatura elevada.

‘Reparação’ é a única ação para os passos considerados indevidos.  E ainda, não devemos nos esquecer, de que são os ‘passos indevidos’ que nos proporcionam o aprendizado e nos levam à posterior experiência.



quarta-feira, 21 de setembro de 2022

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UM SENTIMENTO NA CURVA

O amor nasce de um leve interesse, de um olhar e atenção despretensiosos e não esperados, porque de fato, não se sabe mesmo, quando ele vai brotar.  Onde antes não havia conhecimento ou sentido, passa-se a construir uma conexão, cada vez mais forte, de cumplicidade e satisfação na presença.  Aos poucos ou às vezes, rapidamente, se torna frondoso e intenso, surpreendendo e atingindo seu ponto mais alto.

E pelas mesmas razões, só que inversas: pelo desvio do olhar (que não suportaria explicar o ‘por quê’ da distância), não só pelo enfraquecimento da conexão existente (resultado do fim da cumplicidade); muito mais pela presença, que já não é mais prazerosa.  É o começo de um declínio, lento, mas certo.

Mente quem diz, que ele a tudo suporta, porque é feito de substância que não aguenta corrosões, nem altas temperaturas ou baixas, nem abalos que comprometam sua estrutura - ele é humano, tanto quanto o é, o próprio ser que o sente.  Como organismo vivo, sua anatomia precisa de alimento para continuar sendo do jeito que é - não se retroalimenta, pois não come de seu próprio fruto e não bebe de sua própria água  Palavras jocosas aqui, um desrespeito ali, uma desqualificação num momento importante, uma omissão, uma ofensa - mesmo que aleatórios ... uma opinião ignorada, um pedido justo não considerado; vão minando, o que nasceu tão bonito e que tem um fim tão feio e triste.  Todos os ataques sofridos, em que não se reconheceu o erro, em que não se fez o que era necessário, e em lugar disso, houve continuidade do comportamento abusivo e desrespeitoso - têm efeito fatal sobre um sentimento tão forte, mas tão necessitado de raízes fincadas no respeito e cuidado.



segunda-feira, 19 de setembro de 2022

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DONDE

Ahí es donde quiero quedarme, donde el alma se calma y la esperanza renace. Donde muere la angustia y brota la certeza. En el lugar donde florecen las suaves ramas del amor que me acogen, como si fuera mi hogar.  Allí no hay frío, solo un olor dulce y cálido de ternura y placer. Dos brazos abiertos, que cuando me involucran, me guardan de todo miedo - dentro de ellos no hay peligro.

¿Cómo puede caber tanto dentro de un simple abrazo? ¡Que sea bendito!