sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

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UMA CRÔNICA SOBRE EXAGEROS __  01/02/19






De cara com a janela escancarada, eu quase rezo, pra que entre uma brisa refrescante.

Jogado sobre a cama ardente, na câmara ardente que se transformou o meu quarto; recebo toques pesados e nada naturais, do vento falso e quente, que o circulador de ar joga em mim, é o melhor que ele pode fazer.  E em vez de brisa fresca, só o que eu consigo é um bafo tórrido.

Acordado, tenho chance de cronometrar o intervalo de tempo exato, entre um avião e outro, que corta o céu e faz uma curva bem acima do meu bairro.  Parece que tem um trevo aéreo, de passagem obrigatória a cada aeronave que levanta voo, independente de seu destino.

Chego  à conclusão, de que estou enganado com relação à noite. Enquanto durmo, pensei que ela dormisse também - mas ela não dorme.

Ela sobe e desce a rua, barulhenta ou em silêncio. Eu a escuto acelerando, a esticar as marchas nos trechos compridos da avenida próxima e sei também quando ela é obrigada a frear num cruzamento perigoso, quando o semáforo se fecha abruptamente.

Eu a escuto latir, guardando e defendendo a propriedade do dono e ao seu próprio território.

Ela ri em algumas festas que acontecem nesse exato momento, ela chora desesperada em hospitais, agora mesmo.

De volta ao quarto, quero dizer câmara, enquanto meus líquidos corporais fervem - eu sei que ela, em absoluto, não dorme - muito menos eu!

Sinto o meu sangue fluir com preguiça, pelas veias, dentro dos meus membros inchados, pelo rigor da temperatura,   Ah ... não fui feito pra tanto calor, nem pra viver nessas condições de desconforto.  Como estarei de pé amanhã, pronto pra cumprir as minhas obrigações! ... e em qual estado físico e psicológico!  De nariz entupido, acabado e mal humorado!   Não serei o pó da rabiola, mas o pó da ferrugem da cangalha do balão.

Eu me pergunto: se acaso meu corpo sobreviva, ao derretimento nesse verão ... será ele também condenado a trincar de frio, no próximo inverno?  

Desse jeito, morremos mais cedo - cozidos, fritos, assados, desidratados, pra depois sermos congelarmos, dentro de poucos meses. 

Além de todas as lutas, que somos obrigados a travar, com vários leões por dia, têm também as adversidades climáticas que nos castigam ... só de pensar, já entro em desespero e sinto mais calor ainda!


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