Sempre penso, sentado às pedras da enseada, contemplando o mar, e conjecturando, se acaso eu o tivesse cruzado, se a dor teria ido comigo, se me acompanharia em outra parte do corpo e em outras coordenadas geográficas, ou teria ficado em terra, temendo as tormentas de águas estranhas, talvez assim acovardada, teria me deixado livre. Nunca saberei.
A crença velha, conservada, semeia descrença. Repassada, remonta à falta, reforça o medo, que já existe dentro de mim, igual ao que existe em qualquer um, e o faz ficar tão grande e assustador, que me prende ao chão com raízes que ninguém vê.
Faz parecer que em vez de homem sou planta. Mas se até as plantas acham um jeito de viajar para longe: uma flor que encanta aos olhos, é colhida, perderá sua vida em poucas horas, mas viaja; um fruto macio e doce cativa o paladar, morre, mas sai do seu pé; os esporos que se soltam e seguem com o vento; as sementes que cruzam grandes espaços na barriga dos pássaros. Todos aceitam o risco, pagam um certo preço pela mudança.
Teria sido meu tiro no pé? Ir? Ou ficar? Nunca achei um tamanho de tapete, grande o bastante pra esconder a dor, ela é algo que não se deixar esconder, ou esquecer. É uma entidade que tem vida própria, uma vez nascida, não morre tão fácil, nem de doença, nem de velhice, pois quanto mais velha fica, mais dolorida e mais rabugenta se torna.
Quando vou até a ponta mais longínqua do pier, no ponto mais distante do continente e mais próximo do coração secreto do oceano ... longe de ser um filósofo, me torno um pensador.
Não chego a conclusão nenhuma. Nem uma dúvida a menos, nem uma certeza a mais. Volto com a sensação, de que devo continuar retornando ao mesmo cais, com as mesmas indagações; quem sabe um dia eu ouça o que o mar quer me contar, quem sabe de uma próxima vez, eu entenda o que ele me fala, e eu compreenda.
Deixo o mar quieto. Voltamos, eu e a minha poesia - meu consolo e analgésico natural.
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