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UMA LINHA VERTICAL
Minhas duas casas silenciam: a que é feita de tijolos e a mental. É difícil, desconsiderar o barulho dos carros lá fora; um avião inesperado, rasgando o ar; um telefone chamando ao longe. O mais difícil, é o 'silenciar daqui de dentro' - dos pensamentos, que batem panelas e tocam cornetas, quando me recuso a ouvi-los.
As palavras, entendemos; os sons, reconhecemos ... mas o nada? ... ora, o nada é o tudo, mas em profundo silêncio ... e quanto a isso, mensurar o quanto ele pesa e compreender o que ele é - se torna uma missão quase impossível. Eu diria que, tentar divisar o nada é um mergulho no seco, num abismo sem fim, capaz de assustar, com a possibilidade de nos perdermos dentro dele.
Fomos educados, a classificar as coisas, através dos conceitos de presença e ausência ... e esse pensamento concreto, dificulta um pouco, imaginarmos 'o nada' - 'estar repleto de tudo' ... e que enquanto estamos quietos, ainda assim há intenso movimento: o sangue circula pelas veias e artérias, o estômago digere o alimento, precisamos de ar ...
O nada é presente ... e ao mesmo tempo, é outros tempos - os passados e futuros - mas não colocados numa linha horizontal ... mas sobrepostos na linha vertical da consciência, que parte da cabeça em direção ao alto. Parece vazio, porém é superlotado de muitas coisas, inclusive de barulhos, vindos de fora e de dentro. Além disso, sem poder tapar o nariz, um cheiro de café vem dançando em direção às minhas narinas, como nos desenhos animados; o canto de um pássaro, que não liga a mínima para meu momento de introspecção, também me acompanha; ambos descem comigo nessa viagem. Levo comigo inclusive, nessa imersão no desconhecido, todas as minhas memórias e pequenas lâmpadas pendentes, que aparecem aqui e ali, para iluminarem a escuridão.
Depois de sondar as regiões abissais, do que parece um vazio, mas não é - dessa aventura corajosa e incrível ... sempre retorno, com ouvidos, nariz e olhos mais atentos.
26/03/21
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