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OUTROS HORIZONTES
Ela sonhava com o mar, sonhava em fazer parte dele. Como pequena gota que era, junto com outras mais, suspensas, a dormirem, enquanto viajavam pelos continentes, por sobre eles, sempre obedecendo as correntes de vento. Às vezes, não tinha vento e nem outras nuvens abaixo da sua; era durante esse tempo que ela ficava a pensar, no marasmo que deve ser, estar em mar calmo. Sem dúvida, ela sentia esse marasmo apossar-se de si, mesmo tão acima dele, quando nenhuma rajada cortava os ares, nenhum pássaro se aventurava a ir tão alto. Mas era seu sonho, de doce que era, queria estar dentro dele, sentindo ressecar-se com o sal que lá existe.
Sabia muito bem, que a partir do instante em que caísse sobre o oceano e se de fato caísse, não seria mais doce e perderia sua identidade. O sal e o anonimato fariam com que se fundisse, àquele volume colossal de águas; sabia também que debaixo do marasmo aparente da superfície, alcançaria muito mais vida, do que estando lá em cima, a depender dos ventos. No mar há ventos também, era certo. No mar há muitas outras criaturas, que desejosa de conhecer, mal se continha na expectativa de precipitar-se sobre ele, para poder sondar-lhe as regiões abissais, e mesmo que fosse sem consciência de si mesma, estaria a desvendar outros horizontes, diferentes daquele que ela estava cansada de ver. Por isso, ela ficava sempre na pontinha da nuvem, na parte debaixo dela, esperando uma oportunidade de saltar, assim que fosse espremida pelas outras gotas ou empurrada por um vento mais frio.
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