sábado, 29 de novembro de 2025

1713




QUEM É O DONO?

Não existem amores impossíveis. Todo amor carrega em si a possibilidade de ser.  E sendo um sentimento espontâneo, não depende de ser aceito ou correspondido, para continuar sendo.  Ele é.  

Quando nasce, expande-se para fora do peito, num movimento de ida.  Caso não encontre retribuição, acostuma-se a dar-se, simplesmente, porque não caberá mais no lugar de onde saiu.

O amor é de quem o sente, e não a quem se dirige.  E isso muda tudo.


imagem __ christian schloe


sexta-feira, 31 de outubro de 2025

 1712



AMORES-PERFEITOS

Tenho para oferecer um amor imperfeito, que ainda sobrevive da presença, conta com o  toque e espera pelo olhar.  Quer ser aceito do jeito que ele é!  Porque na ausência ele desfalece, na distância se cala, no silêncio se recolhe.  Engana-se, quem pensa que esteja a morrer, ele apenas começa a alimentar-se de si mesmo.


Por enquanto, a perfeição é só para as flores!





quarta-feira, 22 de outubro de 2025

 1711



MADREPÉROLA


A cada manhã, na disposição de continuarmos a partir de onde paramos ou de reiniciarmos de outra forma, e dessa vez fazermos melhor do que antes; os grãos de areia que nos ferem os olhos, a pele, o coração, são revestidos com o nácar valioso da nossa superação.


Porque a dor, ah a dor!  Sempre existirá.  E o que dói em mim, pode não doer em ti, e não há como descrever com precisão a dor, só sendo sentida, é que saberemos o que é.


Levando em conta a sensibilidade de cada um ou a capacidade de suportar; a despeito de todo cuidado, de toda atenção que se possa ter para evitá-la, mesmo assim, ela vai doer.


Algumas dores, sabemos identificar onde dói, em qual parte do corpo; outras, parecem doer em alguma parte inexistente dele, e essas são as dores da alma.


A cada recomeço, colocamos mais e mais camadas de nácar.  Somos fazedores de pérolas


sábado, 4 de outubro de 2025

94






UM OLHAR SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO

CAFÉ PROFUNDO


Tenho saudade do tempo, em que a distância entre duas pessoas era só uma questão física.  Lembro ainda, de quando ouvíamos uma voz ‘viva’, do outro lado da linha telefônica - a nos dizer sim ou não.  Penso, que se ainda existem pessoas educadas e prestativas, elas são as de mais idade.  Difícil encontrar quem se permita uma conversa de olhos nos olhos e de peito desprotegido.  


A tecnologia está ao nosso favor, mas quando deixa de atender às nossas necessidades, por algum motivo, não há como acessar o que é preciso.  Os meios de comunicação mais atuais facilitam a conexão verbal, o reencontro de velhos amigos, porém muitas vezes, essa conexão se mostra rasa demais.


Sinto a distância de quem está perto.  Desespero quando ao tentar falar com uma ‘máquina’, ela não me entende, porque o que eu desejo não se encaixa em nenhuma das suas opções.  Em contrapartida, vejo um crescente desinteresse no atendimento pessoal, e no lugar de fazer o que são pagos para fazerem, na verdade nos prestam um desserviço.  Quase não se veste mais nenhuma ‘camisa’.


Nas conversas de hoje, nem é mais preciso que o outro revire os olhos - sinalizando-nos indiferença ao assunto, simplesmente, ele abaixa seus olhos para o que tem nas mãos, porque afinal as mídias são muito mais atrativas.


Onde foram parar, os longos e largos goles de café profundo, entre amigos?  Ficaram no passado, pois cada um tem suas urgências, portanto sem tempo para ser perdido num café.  Quantas vezes, só de falarmos a respeito de alguma questão nossa, encontramos as respostas, sem que o outro dissesse absolutamente nada?  Isso era muito terapêutico!


Nos acostumamos à força, a estarmos sós, à deseducação, aos monólogos internos, aos desserviços que nos prestam, a cortarmos o assunto ao meio, a tomarmos nosso café sozinhos.  Trocamos tudo por ‘informações’, as quais somos incapazes de reter na sua totalidade, e de maneira nenhuma estão nos ajudando a convivermos melhor.




sexta-feira, 5 de setembro de 2025

1710


HORAS E DIAS

Não são as nuvens que passam, mas o planeta que gira.  Não é o fardo que pesa, mas o valor que dou às coisas da vida.  Não é a pressa que deixa cru* o que devo viver, mas a ausência de mim, no momento presente.  Não é o medo que paralisa, e sim a minha falta de fé. Não é a dor que apavora, mas desconhecer sua origem.  Não é a culpa que me morde a alma, mas a responsabilidade pelas consequências às minhas escolhas.


De todos os cálices, dos quais sou forçado a sorver, o mais penoso de engolir, é aquele ofertado por mãos conhecidas, e ainda assim, sei que é preciso aceitar seu amargor.  De todas as horas e dias escuros, que sou obrigado a atravessar, os mais tristes são aqueles em que me sinto sozinho.



* Do ditado popular : "O apressado come cru"

domingo, 17 de agosto de 2025

1709


 



ENTRE A LUZ E A SOMBRA


Quando tento barrar a luz, para que ela não passe por mim, e assim ofereço o meu corpo como escudo, crio uma sombra infinitamente maior, do que o tamanho que eu tenho.


Como a luz é capaz de projetar-se em leque, e ganhar força e espaços inimagináveis; a sombra também pode adquirir uma proporção fenomenal, muito além do que se possa supor.  Estarei então, sendo obstáculo para que a luz se propague e atinja lugares onde nada se vê, onde nada se perceba ou se conheça, mas onde todo sofrimento existe.


quinta-feira, 10 de julho de 2025

 1708




TEMPO DE REFLEXÃO

Deixei doer o quanto precisou.  Não a substituí por qualquer coisa efêmera, não amordacei sua boca, só olhei-a nos olhos e lhe prestei atenção.  Porque ela deve gritar, xingar e esbravejar; até maldizer se for o caso, até sussurrar, se assim o quiser.  Não importa de qual linguagem se sirva, para se fazer clara, devo acolhê-la e dar-me tempo de reflexão.. Pois ela é a entidade mais gabaritada, ela e só ela conhece as origens de si mesma.  Reivindica ser escutada, olhada, sentida, compreendida, antes que se dê por satisfeita.  Talvez ela nem acredite em milagres, mas o melhor dos unguentos é ver-se legitimada.


A dor?  Ainda dói e vai doer, mas dói diferente, porque dói entendida.



arte __ brendda lima


quarta-feira, 9 de julho de 2025

1707




PLÁGIO

Senti meus pés presos ao chão, como se tivessem perdido a forma e assim,  se encontrassem incorporados ao solo.  Num esforço descomunal de concretizar um passo sequer, me vi atolado na substância indefinida e pegajosa, que havia se transformado em armadilha.  Eu não afundava, tampouco conseguia andar, dominado por uma estranha força, que me mantinha cativo na inércia.  O desespero era patente, sob o medo de ficar para sempre enraizado, num espaço nem um pouco agradável, e que poderia tomar conta de todo o meu corpo.  Impossível precisar, por quanto tempo já se arrastava a agonia.

Então, numa longa e profunda transpiração da alma, saindo de uma irresignada trajetória,  retirei minha atenção dos pés e me dei conta de que havia muito mais do que chão.  Plagiando os pensadores e filósofos, que vieram séculos antes de mim e certamente, passaram pelas mesmas dores e incertezas; percebi que há céu para ser respirado, há águas doces para saciar a minha sede, há matas para acalmar as minhas vistas, há montanhas para que eu possa ter uma visão mais ampla de tudo.  Do alto pude ver as águas salgadas, que puderam curar as minhas feridas.


quarta-feira, 2 de julho de 2025

 1706




FENDAS DE TODOS OS TAMANHOS


Todos nós trazemos fendas não visíveis.  Rachaduras profundas, outras menos. Por elas entra ou sai a tristeza; entra bem menos do que ‘aquilo que precisamos’, e talvez por serem tão fundas, dificilmente ficarão cheias.  Mas só nos damos conta de suas existências, quando elas direcionam as nossas escolhas, para caminhos que se revelam tortuosos - miramos no que vemos e acertamos no que não queríamos - é essa a dinâmica do olhar adoentado que temos.  E a cada escolha desacertada, somos forçados a ‘revermos’ a blindagem que nos reveste, de descobrirmos o porquê, de nos deixarmos apoderar por sentimentos e emoções alheios e sermos sequestrados dos nossos verdadeiros sentimentos.  Vivendo numa miscelânea de sensações confusas, nos vemos obrigados a ‘degustar’ uma salada desagradável ao paladar e indigesta.


Como seres fragmentados, andamos por aí, com feridas a céu aberto, expostos a todo tipo de contaminação, a todo tipo de invasão, deixando sair o que é bom, sujeitos às doenças da alma. Tanto quanto, as fendas da geologia podem causar terremotos e explosões; essas fendas que existem em nós, também podem desencadear choques internos, convulsões emocionais e implosões.



domingo, 29 de junho de 2025

1705





HIPÓTESE E TESE


Perdido entre os pensamentos, que me fazem ‘sentir’ sentimentos correspondentes ao que penso.  Sentindo, o que me faz pensar pensamentos equivalentes ao meu ‘sentir’, proporcionais em peso, volume e intensidade. Nesse círculo vicioso, onde percorro a linha curva, que retorna ao ponto de início, corro atrás do meu próprio rabo, e invariavelmente, quando o alcanço, volto a mordê-lo.  


O que deveria ser apenas um ciclo, do qual eu me libertaria naturalmente, torna-se armadilha, que me mantém subjugado às condições insalubres, de repetição de ideias e re_sentimentos.  


A inteligência, a percepção e a intuição, sempre atuam a nosso favor.  Elas nos fazem observar, analisar as situações e formar opinião, mas como nos falta confiança no nosso ‘taco’, e por medo de aceitar o que apesar de muito claro, é também doloroso; preferimos o ‘benefício da dúvida’.  Elaboramos hipóteses, que enquanto apenas hipotéticas, quase não machucam, ferem superficialmente.  Quando são constatadamente observadas, e se tornam tese, são devastadoras, cortam profundamente, revirando a lâmina dentro da carne.


Somos obrigados a velar, para depois enterrar uma expectativa, a respeito de algo ou alguém.  Aos poucos, vamos tendo que dizer adeus a tudo que virou tese, a aceitar à realidade, que já havia sido visualizada por nós.  Entramos no processo de luto, onde enterramos muito mais do que nossas expectativas, enterramos pessoas, sonhos; enterramos um pouco de nós mesmos. Só o quê não conseguimos enterrar: as nossas memórias, os nossos sentimentos; mas eu acredito que talvez, tudo seja uma questão de tempo.  


Transformar um círculo em ciclo, requer de nós sustentação, para atravessarmos o período de luto; coragem de darmos não um passo, mas um impulso, em direção a outro ciclo, novo, mais elevado, consciente, maduro.  Mesmo que não sintamos o chão, mesmo que seja dado no escuro - o que nos move é a necessidade de fecharmos um círculo de sofrimento.




quinta-feira, 26 de junho de 2025

1704




ENTRE O CORPO E O SILÊNCIO 

Eu sussurro, como num pacto que não devo quebrar.  

Aceito e acolho o que chegou até minhas mãos, porque me fez ser quem eu sou. 

Entrego, o que ainda não 'pôde' ser. Aprendi que a transformação só acontece fora da vigilância, sem armadura e no recolhimento.  É quando, solto a rédea da pretensa e ilusória tentativa de controle.

Confio, que o que veio, tinha endereço certo.  Reconheço que minha mente tem medo, mas a minha alma conhece a confiança e outras tantas virtudes. O sofrimento é abandono interior e a mente precisa escutar o que a alma diz, porque ela fala - ah! e como fala! Para ouvi-la, devo calar os pensamentos, pois fazem muito barulho, só assim o diálogo pode acontecer.

Agradeço ao universo, pelas inúmeras dádivas, pois agora ele me escuta, depois de me despojar da falta, da queixa, do descontentamento.  Só a gratidão é capaz de converter a 'falta' em presença, em algo muito mais valioso - como um bálsamo que cuida do que estava partido, transmuta e remodela a minha realidade, numa versão mais favorável a mim mesmo.


arte __ agnes cecile

quarta-feira, 11 de junho de 2025

1703




UM DENOMINADOR COMUM


Até o mais ferrenho crente no diálogo, aquele que acredita no poder das palavras, de esclarecer e encurtar distâncias - até mesmo ele, será obrigado a admitir, em algum momento, a inutilidade delas.


Não que ele desacredite ou duvide do significado de cada uma, mas ele sabe, que para haver comunicação é primordial que as partes a desejem.


Não há denominador comum ou acordo ou entendimento, a que se possa chegar, quando há a negação da existência de desencontro, ainda quando a questão já se encontra cristalizada de um dos lados.


Frustrado, em primeiro lugar consigo mesmo, mas depois percebe que não é falha sua, e que por mais eloquente que seja, é impossível tocar, nem que seja de leve, quem não deseja ser tocado.  Alguém que nunca baixa a guarda, rechaça qualquer tentativa de aproximação, mantém-se categórica e hermeticamente fechado em sua razão.  Talvez tema, que uma vez aberta, nunca mais a consiga fechar.


quarta-feira, 4 de junho de 2025

1135

CANTAR E CONTAR
26/02/20


Amélia morreu de inanição, depois de consumir-se a si própria,
numa autofagia. Enrolada e acocorada, foi-se, mortificando sua carne, a um canto, sem um pio, sem comida, sem agasalho,
sem teto, sem reclamar, roxa e ressequida.
Se achava graça de sua desgraça, não se sabe,
talvez tenha sido puro sadismo, de quem dava voz à melodia,
por sinal, uma voz bem desumana!
Mas acho que foi mesmo desamor,
dela, para com ela mesma, sem nada exigir,
ou levantar-se para seguir adiante ...
antes mesmo de ser um descaso,
da parte de quem dizia, que a amava.
Não, não a amava! A odiava!
Se amasse, a respeitaria como ser vivente,
como ser livre, que escolhe ficar, podendo ir.
Ela não seria retratada como uma prestadora de serviços,
cúmplice da preguiça de quem a descreve, dentro de uma inércia de causar nojo.
Ele lhe traria os melhores quitutes, flores,
lhe daria as mais lindas vestes, uma casa aconchegante,
faria dela uma mulher de verdade, mesmo(!)
e não um espectro com alguma serventia.
Que bom que ela tenha morrido, pois não era de verdade,
nem sequer era mulher, sua vida foi uma apologia aos maus tratos.
Quem a cantou, deveria se envergonhar, de não ter pensado
numa letra mais adequada ao romance que tentou contar,
se é que foi mesmo essa, a sua intenção!
arte | agnes cecile

1702





HIATO 2

Desgosto sobre desgosto - des_gosta; escuridão atrás de escuridão - des_lustra.  Inútil foi tentar reaver o brilho, muito menos soprar o fogo que mantinha o sentimento aceso.  Passou um vento forte, ao qual nenhuma chama resistiria acesa.

Criou-se um hiato, que não se detecta em nenhuma parte do corpo. Abriu-se um buraco, uma fenda na alma, por onde já escorreu toda a boa intenção, todo o tempo de espera, toda a graça e não há nenhuma ponte capaz de transpor essa distância - essa boca que a tudo engole. 

sexta-feira, 30 de maio de 2025

 1701




NADA 

De silencio en silencio, escribo una carta póstuma.

De palabra en palabra tragada, es muerte…  Muerte de la comunicación, muerte de la esperanza, del reencuentro, del acuerdo o reparación.


Se levanta un muro de bloques pesados, alto y frío, con mortero fuerte. Nada más se ve, nada se oye, nada se espera.



tragada - engolida

bloques - blocos

mortero - agamassa


segunda-feira, 26 de maio de 2025

1700





AO FINAL


É inútil esperar que as paredes respondam a contento, às perguntas que lhes faço.  Elas transpiram sentimentos, reavivam imagens guardadas e as decodificam, da maneira que podem.  Usam de uma espécie de mímica, em vez de palavras, porque não sabem falar.  As suas lembranças mais as minhas, quase que conseguem re_montar a trama inteira, e o que falta(?) é complementado pelos objetos.  Ao final, não me revelam nada que eu já não saiba.


Nem mil demãos de tinta forte podem cobrir o cheiro que exalam.  Nenhuma cor ou textura apaga as imagens nelas grudadas.  Nem o tempo, nem o esquecimento os faz desaparecer.  E ainda que esquecidos, ficariam na memória, impregnados à estrutura física, como fantasmas emparedados.




sábado, 17 de maio de 2025

1699




O CÉU DE CATARINA


Fui encontrar minha criança, no jardim de Catarina.  Ao contrário do que pensava, ela não estava perdida, e sim muito bem achada.  É como se, o tempo todo, ela estivesse a me chamar para lá, mas como não lhe dei ouvidos, parou, já há algum tempo.


Foi preciso apenas um pequeno comando, para que eu baixasse a guarda (um pouco o volume e quantidade dos meus pensamentos) e assim pude identificar o seu chamado.  Imediatamente, nos encontramos.  Eu adquiri sua estatura, de modo que as flores ali presentes tomaram um tamanho descomunal, em relação ao que se imagina.  As minhas preferidas: boca de leão amarelinha e crista de galo em vermelho intenso estão presentes como muitas outras, singelas e delicadas.


Flores que eu nunca mais tinha visto em lugar algum, com cores, formatos e vivacidade quase irreais, ali estão vívidas e concretas.  Somos duas, mas numa só pessoinha correndo por entre elas, com as perninhas curtas e ágeis.  Tocando, aqui e ali, com muito cuidado, explorando tudo com mãozinhas brancas.  O jardim era da Catarina, amiga de minha avó, mas sem dúvida a dona dele sou eu ou uma miniaturinha de mim, que reivindicou a posse dele para sempre, e o batizei como ‘céu de Catarina’.  Lá reencontrei a graça, a alegria de estar rodeada de flores, dando gritinhos, esbarrando nos pequenos arbustos, atrás das borboletas, movimentando todas as folhagens, tirando o sossego do lugar.  Já nem me lembrava mais, do tanto que gosto das flores … e eu achando que preferia as folhas!!!



arte __ mila marquis

terça-feira, 6 de maio de 2025

93




UM OLHAR  SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO

OLHOS E OUVIDOS RASOS


Aos olhos que não querem enxergar, é inútil usar de uma excelente imagem, para fazê-los entender.  Aos ouvidos que se negam a escutar, desnecessário é a melhor explicação ou uma só palavra.  Porque estão condicionados a não executarem nada mais do que as capacidades funcionais dos órgãos.


Obedecem a um mecanismo de defesa, que impede que as informações cheguem ao emocional, sendo mantidas no racional: se veem é para se atualizarem, se ouvem é só para responder. Em lugar de um filtro, existe um bloqueio, entre o que veem e ouvem, e o que deveriam transformar em sentimento.  São olhos e ouvidos rasos.


As tentativas infrutíferas de forçar um entendimento causam profundo estresse, porque constantemente, o interlocutor se sente frustrado, mas não percebe que a cegueira e a surdez são do outro, e não incapacidade sua. Não são apenas esses dois órgãos que estão bloqueados, existe uma vasta rede que se encontra deficiente. Se recusam à troca saudável e condenam-se à exclusão e à solidão.


É impossível bater à porta desse interior, porque nem se sabe onde ela está?  Obviamente que está trancada por dentro, e a menos que um dia ele resolva destrancá-la, ninguém entrará.


quinta-feira, 24 de abril de 2025

1698



EU E O ECO

Tive medo de olhar-te nos olhos.  Temi ser traído pelo sentimento guardado - que ele ficasse evidente, através das janelas da minha alma; e assim, eu seria descoberto. Preferi lançar-te olhares dissimulados - não falsos(!), mas envoltos numa névoa fabricada, para ofuscar a transparência do vítreo.  Só Deus sabe o quanto me custou!

Do contrário, nem sei o que faria, talvez eu negasse, veementemente … ou confessasse, num ímpeto de coragem.  Porém eu quis evitar, forçar-te a uma resposta ou posicionamento.  Pois nem mesmo eu sei, como cheguei a isso(!), como pude dividir a minha vida em duas partes: uma antes e outra depois de ti!   Vivo no ‘entre’, num espaço às vezes espaçoso, às vezes espremido, separado por dois limites finos.   Ah!  O entre!  Lugar onde eu revivo todas as emoções.  


Comparo o que se passa comigo, com uma festa. Dentro do ‘entre’, eu experimento, toda a expectativa, do tempo que a antecede, o entusiasmo crescente.  Rememoro o dia e o momento exatos dela, cada detalhe, com toda a alegria, movimento e brilho.  Até que me deparo com a bagunça que ficou, a casa vazia e escura, tudo o que restou dela, eu e o eco da minha voz.


segunda-feira, 24 de março de 2025

 1697





DE BURACO EM BURACO

Era para ser um agradecimento puro e simples, pois completei ontem, mais um ciclo de vida; mas acabei indo fundo, e falei sobre a linha circular que desenhamos, subindo em direção à evolução, enrolando-se em um eixo vertical imaginário.

Nos parece que andamos em círculos, e andamos mesmo, círculos ascendentes, quase nem percebemos a nossa ascensão, de tão lenta que ela é.  De tempos em tempos, as mesmas dificuldades nos alcançam, não importa o quanto tenhamos caminhado; travestidas e com uma outra face, nos vêm assombrar, de novo a trajetória.


À cada nova investida, estamos um pouco menos vulneráveis a elas, porque nos encontramos em um outro ponto, diria eu: um pouco menos suscetíveis aos velhos desacertos.  Colocarei assim, ‘desacertos’, porque aprender a fazer o ‘certo’ é coisa que requer muita transpiração de nossa parte e muita determinação para continuarmos a enfrentar as nossas próprias fraquezas.  Ninguém se fortalece de um dia para o outro.


A boa notícia é que, junto com essas novas investidas, nos vêm também, um pouco mais de experiência adquirida.  A nossa vida é cíclica e devemos nos negar a repetirmos os mesmos erros, já que de nada teriam servido os apuros anteriores e o aprendizado cairia por terra.  Afinal, buraco conhecido deve ser tampado ou ao menos, sinalizado.


quinta-feira, 6 de março de 2025

 1696




‘QUEM CORRE DE GOSTO, NÃO SE CANSA’


Era o que minha avó dizia, mas eu não imaginava, como isso seria possível.  


Correr é óbvio, cansa sim. O ‘correr’ aqui, significa fazer algo - ‘os corre’ da vida.  ‘Correr de gosto’ é fazer motivado, com paixão e convicto.   Não se cansar ‘correndo de gosto’ é não se desgastar tanto, atingindo a satisfação e a realização com o feito.


Ufa!  Demorou, para que eu entendesse, sobre o que ela falava!