Cheirinho
de vó _______________________ 509
Eu comi e sorvi de seu
amor. Muitas vezes, encostei a minha
cabeça em seu ventre. Mesmo estando do
lado de fora dele e apesar de nunca ter estado dentro, eu podia sentir seu amor,
nutrindo e acariciando-me, numa outra dimensão que não a física ... e que eu não
entendia.
Eu era criança e minha
estatura fazia coincidir a minha cabeça, com a altura de sua barriga ... e lá muitas vezes me aninhei, quando
precisei.
A lembrança disso
trago comigo, o conforto, o calor, o entendimento tácito. Ah que saudade!
Aonde quer que eu vá,
todos os meus sentidos estão alertas, aos cheiros, sons, palavras e pensamentos
que me remetem à sua presença... e me apercebo o quanto tenho dela em mim! O quanto gostaria de ter ainda mais ... e não
tenho!
Dia desses, ao entrar
em um mercado, senti um cheiro de uma gostosura que saía do forno ou fogo, era
algo sendo preparado na cozinha. Eu me
senti, como naqueles desenhos animados antigos, quando um personagem se deixa
levar flutuando através do cheiro que exala da comida que gosta. Eu tive que perguntar o que era que estavam
fazendo naquela cozinha de tão bom, quem entrava também perguntava o que era
... ninguém soube dizer exatamente o que cheirava daquele jeitinho, tão
bem. Houve até uma discussão pra se
chegar a um consenso sobre o que seria, alguma massa, recheio, alguma carne?
Aquilo pra mim foi
automático, antes que eu pudesse pensar, eu me vi pequena, dentro da cozinha de
minha vó, desamarrando o laço de seu avental, rodeando suas pernas, perguntando
quando ficaria pronto o que ela fazia.
Imediatamente, eu
disse ... aos que como eu também questionavam o cheirinho delicioso que enchia
o ambiente – é cheiro de lasanha de vó – então todos concordaram. Naquele momento, todos os envolvidos nessa
dúvida, tenho certeza de que estávamos sendo remetidos à nossa infância, não éramos mais adultos discutindo, éramos
crianças lambendo os beiços.
Eu me ajoelhei à
frente dela
- à lembrança dela –
me fiz pequena, criança de novo, pra poder
encostar a minha cabeça novamente em sua barriga ...
e sentir o mesmo aconchego que ela nunca me negou.
Eu senti o cheirinho do talco que ela usava no rosto,
o cheiro do sabão que usava na roupa...
como eram bons.
Eu senti que ela também gostava do meu cheiro!
À minha querida vó Maria!
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