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AO MAR E À TERRA
06/01/21
Não sei
dizer, se a verdadeira vida, é aquela que vivo por fora ou a que vivo por
dentro. O que faço - todos veem, mas o que sinto - é só meu. Quantas renúncias silenciosas, das quais
ninguém soube que fiz, e que pelas tantas vezes que o fiz, caídas no esquecimento, permanecem secretas, existindo e guardadas numa gaveta. E eu me
desencontro no espaço entre as duas vidas, sem saber muito bem, o que fazer,
juntar ou sobrepô-las e ver como fica, se formam uma inteira, se viram uma só.
A de dentro,
sempre sendo mais contempladora de meus anseios - para onde eu fujo - quando as
coisas ficam demasiadamente chatas. Como vivo, determina a minha posição
na vida, mas o que vai em mim, é exato o que sou!
O cansaço
veio, muitas vezes, por fazer e fazer, repetidamente, aquilo que já era sabido,
que não mudaria nada - e que não seria notado, a não ser por minha própria
consciência - que sempre quis ser leve. E o meu sorriso da aceitação,
ainda que falso, um e outro, sempre persistentes, me fizeram esperar por novos
dias e tentar transferir o incômodo peso do desapontamento, para a vida de fora - que na verdade permeava os dois lados: fora e dentro.
Dói mais na
alma, do que na pele - não ir em busca do que quis e privar-me da satisfação,
que me teria dado. Num sentimento escondido, na hora imprópria, soterrado
em imaginação, de certa forma mentido - pois a cara de paisagem chegou a convencer do
contrário. Foi a alma que se privou e não a carne, quando deixei ir
... Nunca saberei, se era mesmo oportunidade ou uma simples perdição - se foi
juízo ou covardia de minha parte.
Ao fazer
listas de mercado, desejei encontrar em suas prateleiras, aquilo que não se
encontra nelas ... e se acaso encontrasse, imagino que teria um preço impagável
por mim, no entanto, seria muito bom saber que existia.
De vez em
quando, é óbvio que haja um certo desprendimento da minha essência, para fora
do frasco rústico - numa música ouvida, numa paisagem contemplada, numa poesia
lida ou feita por mim; sem o quê, me teria sido impossível, prosseguir e até
sobreviver, com sanidade e decência. A lua nunca se moveu um só
milímetro, mas eu? ... cansei de ir até ela e voltar ... por incontáveis
vezes! Tão logo, perdidas as minhas asas, eu caía de cara com a realidade
– sobre uma plataforma concreta e dura.
Parado em
terra firme, sou um marco, não deixo de avistar e me encantar com o breve movimento
das águas, feito pelos barcos que partem. Reconheço o contorno de um
continente, que embora submerso em águas, é sempre o mesmo, contínuo e ligado ao
outro lado, pelas mesmas águas que separam seus lados opostos e distantes – onde,
os barcos que partiram, vão aportar. Ah! ... quanto céu existe entre os
dois pontos!
"Nem
tanto ao mar, nem tanto à terra?" Pois no meu caso, foi muito mais à
terra!
'Surprises' Ibrahim Maalouf
https://www.youtube.com/watch?v=FKIQ8BBcI6I