sexta-feira, 27 de outubro de 2017





A VIRADA
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Era 31 de dezembro, noite da virada, em que as pessoas se programam sobre o que fazer, comer, beber e vestir.  Alguns preferem o branco – por tradição ou pelo efeito da cor nas fotos.  Outros escolhem outras cores, até por rebeldia.  Uns se contentam em vestir o que têm.

Ela escapou do branco total, tinha escolhido pra aquela noite, um vestido branco com pequenas listas azul marinho.  Era algo bem atual, com babado na barra e nas mangas – uma verdadeira pechincha.

Escolheu brincos azul royal, de pedras brasileiras pra usar junto, correntinha, pulseira e anel dourados.  Usaria um tamanco de verniz branco, com sola de cortiça – perfeito!

Cuidou do cabelo – encaracolou as pontas.  Caprichou na maquiagem, acertou nos tons – deu destaque aos olhos.  Passou um perfume que havia ganho e guardou pra essa ocasião.

Depois de todo o preparo, colocar o vestido foi a última coisa que fez.  Olhou-se no espelho e gostou muito do resultado, tinha superado a expectativa.  Até seu cabelo tinha colaborado – e as mulheres sabem o que isso significa, coisa rara.

Estava se sentindo muito bem, confortável, vestida adequadamente pra ocasião e local.  Sabia disso.  Embora simples e discreta, a sua escolha lhe caiu bem.  Preferia sempre pecar pela falta, do que pecar pelo excesso de adornos.

Foi nessa hora, em que seu marido, como quem não entende nada de estilo ou delicadeza, olhando pra ela, a mirar-se no espelho, fez o seguinte comentário:

“Você vai com essa roupa esquisita?”

Como em outras oportunidades, teria sido um balde de água suja, despejado sobre ela – capaz de desmanchar o penteado, encharcar sua roupa e desintegrar sua autoestima.  Mas dessa vez não.

Pela pausa de silêncio que se fez, parecia até que tal comentário passaria em branco.

Aí então, ela com uma voz calma e assertiva, fez a pergunta:

“Quando foi?”

Ele não respondeu, porque não entendeu, achou que ela começava um outro assunto.

Ela perguntou de novo:  “Quando foi?”

Ele, invocado disse:  “Quê? Foi o quê?”

Aí então ela fez a pergunta completa:

“Quando foi que você me fez um elogio?”

Ele não respondeu, não tinha a resposta.

Mas ela tinha e falou:  “É de sua essência ser rude, sempre tentar acabar com a alegria do outro!”

Se antes ele não tinha resposta, agora muito menos, se calou por completo.

Ela acrescentou com a mesma calma e assertividade:  “Eu estou me sentindo muito bem e sei que estou bonita.  Guarde a sua opinião pra si mesmo!”


Ele continuou sem palavras - não porque tivesse mudado de opinião a respeito – mas porque, pela primeira vez ele entendeu, como se ela tivesse ‘desenhado’ isso pra ele – que a opinião dele não fazia a menor diferença pra ela!



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